Início » Crise climática – ZERO não quer Portugal distraído do fundamental
O Relatório Síntese do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) hoje divulgado na Suíça faz um resumo de todos os relatórios do 6.º Ciclo de Avaliação do IPCC que foram publicados entre 2018 e 2023, sendo que uma nova ronda de avaliação só é esperada para 2027/2028.
O IPCC é o órgão de política climática das Nações Unidas com um papel fundamental no apoio aos governos e ao processo da Convenção-Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas (UNFCCC) na compreensão do estado da ciência. É baseado no trabalho de milhares de cientistas e vai publicando Relatórios de Avaliação abrangentes. Quase todos os países, incluindo todos os membros do G20, estão ativos no IPCC e, por conseguinte, concordam tecnicamente com o resultado do relatório.
Os relatórios cobertos na 6.ª Avaliação do IPCC refletem um consenso científico inegável sobre a urgência da crise climática, as suas causas primárias, os seus atuais impactos devastadores, especialmente nas regiões mais vulneráveis ao clima e os danos irreversíveis que ocorrerão se o aquecimento ultrapassar os 1,5°C, mesmo que temporariamente.
O Relatório reflete sobre o objetivo de manter o aquecimento global abaixo dos 1,5ºC afirmando que este é difícil, mas exequível, e que seria irresponsável desistir dele. A ciência diz que temos de agir rapidamente e que o objetivo ainda pode ser alcançado. É uma questão de vontade política fazê-lo, e não de barreiras tecnológicas ou financeiras.
As alterações climáticas são uma realidade e o mundo de muitas pessoas já está a mudar e até a acabar. Graves secas, mesmo no Inverno, inundações, incêndios, escassez de água, ondas de calor, subida do nível do mar e tempestades catastróficas… já se fazem sentir com o atual nível de aquecimento a 1,1ºC. O caos climático está a causar estragos em vidas e meios de subsistência, saúde e bem-estar humano, infraestruturas e economias, produção de alimentos e cadeias de abastecimento globais – abrandando e invertendo décadas de conquistas em termos de desenvolvimento. Quanto mais sobreaquecermos o planeta, mais o nosso mundo irá mudar para pior. Precisamos mesmo de mudança, mas na direção de sociedades mais seguras e mais iguais.
A década até 2030 é absolutamente decisiva para que o aquecimento possa ser limitado a 1,5°C ou abaixo de 2,0°C. O Relatório de Síntese confirma dados anteriores: para se manter dentro do limite de 1,5°C, as emissões globais de gases com efeito de estufa precisam de ser reduzidas em pelo menos 43% até 2030, em comparação com os níveis de 2019, e em pelo menos 60% até 2035. Quanto mais tempo for necessário até que as emissões globais recuem, maiores serão as necessidades de reduções posteriores.
No entanto, não existe neste momento um caminho credível para os 1,5°C e as atuais políticas têm-nos conduzido a uma aproximação dos 3°C, de acordo com a ONU. Atualmente o aquecimento global ultrapassa 1,1°C, o nível avaliado pelo IPCC para 2011-2020, com cerca de 1,59° C sobre a terra e 0,88° C sobre o oceano. As atuais políticas em cima da mesa, tal como comunicadas nas Contribuições Determinadas a Nível Nacional (NDC), são totalmente inadequadas e tornam provável que 1,5°C seja ultrapassado no século XXI.
Os próximos sete anos são, portanto, essenciais para decidir o nosso destino. No caso das emissões de gases com efeito de estufa continuarem a crescer, os 1,5°C poderão ser atingidos em 2030-2035. Isto sublinha a importância de iniciar imediatamente as reduções, necessárias em todos os sectores.
E sabemos aquilo que é preciso: menos fósseis, mais solar e vento implementados de forma sustentável. Como a falta de esforços suficientes de mitigação consome cada vez mais o restante orçamento de carbono, limitar o aumento da temperatura a 1,5ºC requer ações urgentes e imediatas. Como principal causa da crise climática provocada pelo homem, sabemos que a melhor forma de o conseguir é através da eliminação dos combustíveis fósseis. As emissões de combustíveis fósseis ainda podem ser reduzidas para metade até 2030, porque as soluções para o conseguir existem. A natureza ainda pode ser conservada, restaurada, e utilizada de forma sustentável. O relatório do IPCC mostra os enormes benefícios do desenvolvimento sustentável da rápida implementação da energia solar e eólica e de outras utilizações de energias renováveis, bem como do aumento da poupança de energia, com custos maciçamente reduzidos. A diferença entre 1,5 e 2 graus não é de 0,5 – os impactos seriam duas vezes piores ou mais para muitos riscos (acesso a água potável, perda de biodiversidade, aumento da pobreza e imigração, entre muitos outros). Se ultrapassarmos 1,5 graus de aquecimento global, não é literalmente o fim do mundo, mas o mundo parecerá muito diferente. Cada fração de grau conta e precisamos trabalhar muito, independentemente de onde estivermos.
O custo da inação será muito mais elevado de muitas perspetivas diferentes: quer financeira, quer socialmente e também para governos, empresas e famílias. Os impactos climáticos já estão a afetar todos neste planeta, mas de forma desigual. Os impactos climáticos já estão a afetar todos neste planeta, mas não da mesma forma. Os grupos mais vulneráveis (na Europa e noutros locais) são sempre os mais afetados por esses impactos. Mulheres, crianças, povos indígenas, pessoas com deficiências e doenças, populações mais pobres, e grupos mais marginalizados são mais afetados, uma vez que são menos capazes de se preparar antes de uma catástrofe, reagir e reconstruir.
Todos nós precisamos de agir, mas alguns (países ricos e populações) precisam de fazer mais esforços, uma vez que historicamente poluíram muito mais. As emissões globais de gases com efeito de estufa precisam de ser reduzidas em pelo menos 43% até 2030, e os países historicamente poluidores deveriam contribuir mais do que aqueles que ainda não criaram tantas alterações climáticas e que estão na linha da frente dos impactos. O relatório do IPCC avalia a Europa como a 2.ª maior região historicamente emissora (1850-2019) depois da América do Norte.
Mas há também boas notícias: o IPCC destaca uma série de soluções de adaptação e mitigação que, se tiverem efetivamente em conta potenciais trade-offs e forem implementadas de uma forma liderada a nível local e inclusiva, podem trazer múltiplos benefícios de desenvolvimento sustentável, desde o combate à pobreza energética, à preservação dos ecossistemas, à redução da desigualdade de género e à melhoria da segurança alimentar. E dar prioridade à equidade, justiça social, inclusão e processos de transição justos pode permitir ações ambiciosas de mitigação do clima e desenvolvimento resiliente face ao clima.
Francisco Ferreira, Presidente da ZERO considera que “Há uma razão pela qual se fala sobre um aumento máximo da temperatura de 1,5° Celsius. Não é um desejo, nem uma palavra da moda… é um alvo de sobrevivência científica. Por mais dramática que seja, a equação é bastante direta: conhecemos os problemas e as soluções, resta a vontade política. Precisamos que a União Europeia, e Portugal em particular, sejam líderes climáticos e contribuam de forma séria e coerente para nos tirar das muitas crises que enfrentamos, dando um impulso histórico e de uma vez por todas, comprometendo-se publicamente com o que todos sabem que precisa acontecer para evitar consequências ainda mais terríveis: descartar os fósseis combustíveis e protegendo as pessoas e o planeta”.
Com a mais recente ciência disponível, é ainda mais claro como o Pacto Ecológico Europeu tem de ser mais ambicioso. Os atuais objetivos de redução das emissões em 55% em 2030 ficam aquém do nível da emergência climática e da quota-parte equitativa da UE para reduzir as emissões a nível global. Para ser compatível com o Acordo de Paris, a União Europeia deverá atualizar a uma meta para pelo menos -65% até 2030 em relação a 1990. É necessário aumentar a ambição das diferentes propostas legislativas no “Pacote Objetivo 55” e “REPowerEU” para que estas medidas consigam muito mais do que os -55% previstos. As diretivas sobre energias renováveis (RED), edifícios (EPBD) e o pacote do gás ainda estão em processo legislativo e podem ser melhoradas. Os países da UE precisam de refletir objetivos à escala nacional na revisão em curso dos seus Planos Nacionais de Energia e Clima (PNEC).
No caso de Portugal, o alerta da ZERO prende-se com a necessidade de uma muito melhor gestão da procura de energia, com destaque para as medidas que proporcionem efetivamente uma redução nas emissões no transporte rodoviário individual, edifícios mais confortáveis e eficientes e investimentos em fontes de energia renovável aplicados de forma sustentável. A aposta não pode passar por falsas soluções, como um uso ineficiente de hidrogénio verde como alternativa ao uso de eletricidade renovável ou de investimentos que dão prioridade a soluções tecnológicas que nos distraem dos objetivos de mitigação das emissões como a captura e armazenamento de carbono (CCS), a remoção tecnológica de dióxido de carbono (CDR), ou a compensação de emissões evitáveis.
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