Início » No Dia Nacional do Ar, a ZERO apela à criação de zonas com restrições ao tráfego automóvel no centro das cidades
Concentração média de dióxido de azoto na Av. da Liberdade em Lisboa acima do valor-limite anual
Comemora-se amanhã, dia 12 de abril, e pela terceira vez, o Dia Nacional do Ar
Instituído em 2019 com o objetivo de destacar a importância da qualidade do ar e sensibilizar a população para a necessidade de conhecer e atuar com vista à proteção e melhoria deste recurso indispensável à vida, assinala-se amanhã o Dia Nacional do Ar. Neste sentido, a ZERO alerta novamente para o papel de uma mobilidade sustentável, na medida em que o setor dos transportes, em particular o transporte rodoviário, é a principal causa de poluição do ar nos centros urbanos portugueses.
As zonas de emissões reduzidas proliferam nas cidades Europeias e mostram-se claramente eficazes na redução da poluição e das emissões de dióxido de carbono
Há cada vez mais cidades europeias a tomar medidas para reduzir a poluição atmosférica tóxica e o impacto climático que os automóveis representam. Estas medidas são diversas, desde a criação de zonas de emissões reduzidas (as chamadas ZER) que limitam a utilização de veículos mais poluentes, até restrições gerais do transporte motorizado, através da criação de zonas zero emissões (as chamadas ZZE, zonas da cidade praticamente livres de veículos a combustão).
As zonas de emissões reduzidas têm tido uma aceitação particularmente forte em mais de 250 cidades europeias, pois têm-se mostrado claramente eficazes na redução de emissões. Vários países europeus (incluindo a França, Espanha e Países Baixos) têm mesmo vindo a definir tais zonas como instrumentos fundamentais na proteção do ar limpo nas cidades e do clima, o que irá acelerar a sua disseminação.
Em Portugal, só Lisboa tem uma zona de emissões de reduzidas (ZER) com efeitos praticamente nulos dada a sua profunda desatualização em termos de exigências.
Estudo recente mostra que as zonas zero emissões ou emissões reduzidas são benéficas para o comércio local
É frequentemente alegado que as zonas de zero emissões ou de emissões reduzidas podem ter um impacto negativo no comércio local. Em dezembro de 2021, uma análise da Campanha Cidades Limpas, organizada por uma coligação de organizações não-governamentais da Europa, entre as quais está a ZERO, concluiu que menos carros nas ruas podem representar uma tábua de salvação para as economias locais.
Os dados compilados mostram que as políticas públicas urbanas que condicionam a utilização do automóvel em geral ou especificamente a dos mais poluentes – tais como as ZZE ou as ZER, respetivamente – são um contributo positivo para o comércio local.
Os dados mostram ainda que, quando tais políticas são combinadas com fortes investimentos em transporte público, os resultados são ainda mais positivos. Ao contrário do que é o pensamento comum dos proprietários de lojas, os clientes que andam a pé, de bicicleta ou que utilizam transportes públicos tendem a gastar mais dinheiro no comércio local do que os condutores de automóveis.
A ZERO e as restantes organizações da coligação consideram por isso que políticas que desincentivam o uso do automóvel particular e, em paralelo, estimulam o uso do transporte público, as deslocações a pé e de bicicleta, investindo fortemente nesta forma de mobilidade, podem ser um verdadeiro salva-vidas para as economias locais das cidades. Os autarcas e governantes devem assim dar prioridade à implementação de zonas de baixas ou zero emissões, pois é uma tripla vitória para um ar mais limpo, para o clima e para as empresas locais. Modos ativos de transporte e transportes públicos – e não automóveis – representam melhores negócios.
Existem mais de 250 zonas de emissões reduzidas em toda a Europa, e a ZERO considera que as cidades portuguesas devem juntar-se a este movimento
A tendência Europeia no sentido de criar restrições ao tráfego automóvel poluente nos centros das cidades é clara. A ZERO considera que as Zonas de Emissões Reduzidas e as Zonas de Zero Emissões são um instrumento de política pública ao dispor das cidades para melhoria da qualidade do ar e do conforto do espaço público, mas que em Portugal não está a ser devidamente aproveitado.
Para implantar estas zonas a médio prazo, o caminho tem de ser preparado desde já. As autarquias devem-no fazer progressivamente, começando nos centros históricos e alargando-as às zonas mais periféricas. Para aumentar a aceitação, estas zonas podem começar por existir em períodos de tempo limitados, como aos fins de semana e feriados.
Lisboa com valores demasiado elevados de dióxido de azoto na Av. da Liberdade, arriscando multa da União Europeia
A ZERO tem vindo a acompanhar em detalhe a evolução da qualidade do ar na cidade de Lisboa, recorrendo às concentrações de dióxido de azoto (NO2) medidas nas estações de monitorização da qualidade do ar geridas pelas Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional e cujos dados (provisórios) são disponibilizados pela Agência Portuguesa do Ambiente.
De momento, desde 1 de janeiro de 2022 e até 8 de abril de 2022, a média de concentrações de dióxido de azoto é de 47 µg/m3, fruto do tráfego automóvel, valor acima do limite em termos anuais de 40 µg/m3. A ZERO lembra que decorre no Tribunal Europeu de Justiça uma queixa contra Portugal por má qualidade do ar em diversas zonas do país, incluindo Lisboa, não se vendo medidas suficientes a serem tomadas para contrariar a situação. Uma decisão desfavorável pode implicar o pagamento de uma multa substancial por parte do país, ou seja, os contribuintes.
Nas cidades, o dióxido de azoto no ar é principalmente consequência direta dos processos de combustão que têm lugar nos veículos, com maior responsabilidade dos que utilizam o gasóleo como combustível, os quais apresentam maiores emissões comparativamente com os veículos a gasolina.
O dióxido de azoto em concentrações elevadas causa efeitos que vão desde a irritação dos olhos e garganta, até à afetação das vias respiratórias, provocando diminuição da capacidade respiratória, dores no peito, edema pulmonar e danos no sistema nervoso central e nos tecidos. Os grupos mais sensíveis como as crianças, os asmáticos e pessoas com bronquites crónicas são os mais afetados. Este poluente pode ainda fazer aumentar reações alérgicas a alergénios de origem natural.
Legislação europeia está completamente desalinhada da evidência científica e por isso tem de ser revista com urgência
A Agência Europeia do Ambiente publicou há alguns dias a sua última análise da qualidade do ar na Europa (1), apresentando uma análise do panorama em 37 cidades europeias em 2020 e 2021 (nesta caso uma análise ainda provisória). O estudo baseou-se em medições das concentrações de partículas (que causam arritmia cardíaca, ataques cardíacos, ataques de asma e bronquite, entre outros), dióxido de azoto, ozono (um irritante respiratório) e benzopireno (um carcinogénico).
O relatório mostra que 96% da população urbana (incluindo Lisboa) está exposta a concentrações de partículas que excedem as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) e a evidência científica do que são os valores seguros, embora só 1% esteja exposta a níveis que excedem os presentes na legislação europeia. Durante os confinamentos, os níveis de dióxido de azoto baixaram cerca de 25%, mas mesmo assim 90% da população esteve exposta a níveis superiores aos desejáveis.
Além desta situação preocupante que o relatório expõe, fica ainda claro que a legislação europeia para a qualidade do ar é extremamente permissiva. A ZERO entende que os valores limite de poluentes na Europa devem ser alinhados com a evidência científica e as recomendações da OMS, sob pena de se continuarem a não tomar medidas conducentes à resolução deste silencioso mas importante problema de saúde pública. Por exemplo, para as partículas finas (PM2,5) e para o dióxido de azoto, os limites legais anuais vigentes na UE são quatro vezes mais elevados do que as recomendações da OMS.
Nota para os editores:
(1) https://www.eea.europa.eu/highlights/vast-majority-of-europes-urban
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