Carro elétrico ou carro a combustível: afinal, qual o melhor para o ambiente?
O elétrico, mas é preciso reduzir o uso de transporte privado
Se tivéssemos de escolher entre carros elétricos – e referimo-nos a 100% elétricos a bateria – e carros a combustão (a gasóleo ou gasolina), escolheríamos os elétricos, mas com um asterisco: num mundo ideal, não usaríamos nenhum. O melhor seria mesmo andarmos a pé, de bicicleta ou de transporte público, sobretudo de comboio, porque sim, os carros elétricos também poluem.
Então se ambos são poluentes, porquê escolher o carro elétrico? Para responder a esta pergunta, vamos perceber como são feitos os nossos carros e o que os move. Sem complicações!
De onde vem a energia?
O movimento requer energia. Para um carro a gasóleo ou a gasolina, a energia vem da queima interna destes dois combustíveis. A queima do gasóleo e gasolina produz grandes quantidades de energia que o carro utiliza para andar na estrada; infelizmente, também produz um conjunto de gases e partículas que saem pelo tubo de escape, e que são prejudiciais à saúde e ao ambiente.
Os carros elétricos, por outro lado, usam eletricidade da rede elétrica que fica armazenada nas baterias. Não precisam de nenhuma queima interna para ir buscar energia e, por isso, também não produzem fumo tóxico. O problema está resolvido. Será?
Primeiro, embora não produzam fumo, os carros elétricos têm emissões associadas de partículas provenientes do sistema de travagem e pneus, nomeadamente partículas, e que não são completamente negligenciáveis.
Segundo, ligar a tomada é um gesto quotidiano que parece inofensivo, mas como é produzida esta eletricidade? Em 2022, as energias renováveis abasteceram cerca de 59% do consumo de eletricidade em Portugal, e cerca de 38% proveio da queima de gás fóssil. Já em muitos outros países europeus, a percentagem de combustíveis fósseis – o que inclui carvão – é muito superior. Quando a eletricidade é produzida por carvão ou gás natural, a promessa da benevolência ambiental do carro elétrico esbate-se.
As emissões não saem, portanto, do tubo de escape, mas saem pelas chaminés das centrais termoelétricas. O que, ainda assim, continua a ser uma vantagem, pois a poluição urbana reduz-se substancialmente, e em emissões de CO2 de ciclo de vida, mesmo no pior dos casos em que o cabaz de eletricidade é essencialmente fóssil, um carro elétrico continua a garantir pelo menos cerca de 40% menos emissões que um carro a combustão, pois é muito mais energeticamente eficiente que um carro a combustão.
Receita para fazer um carro
Para produzir um automóvel (elétrico ou não) são precisos plásticos, borrachas, fibra de vidro, aço, entre outros muitos materiais. O resultado é uma máquina que pesa cerca de uma a duas toneladas que normalmente é usada para fazer deslocar um ser humano que pesa menos de 100 kg. Cada um destes materiais foi extraído, processado e produzido em partes diferentes do mundo, por norma. Por fim, estes ingredientes são transportados para as diferentes fábricas, para serem transformados em diferentes peças. Provavelmente o nosso carro viajou mais do qualquer um de nós humanos, e produzir duas toneladas de todos estes materiais polui e muito.
Segundo o relatório da Agência Europeia do Ambiente, a produção de um carro elétrico implica mais emissões CO2 e outros poluentes que a de um carro convencional – no caso do CO2 é à volta do dobro –, e por estas razões dizer que um carro elétrico não tem emissões não é verdade; o carro elétrico não produz emissões no tubo de escape enquanto o usamos, mas teve muitas no seu processo de produção.
Isto tem que ver, nomeadamente, com a grande incorporação de metais raros de que os carros elétricos necessitam, nomeadamente nas suas baterias – um carro elétrico precisa de cerca de seis vezes mais metais que um carro convencional, tais como cobre, lítio, cobalto, níquel e grafite. Estes metais encontram-se no interior da Terra misturados na rocha ou outros materiais em percentagens muito baixas.
Vejamos o lítio, por exemplo, que apresenta taxas de extração 0,05–0,15%. Isto significa que é preciso extrair e processar duas toneladas de rocha para conseguir obter 1 kg de lítio! Não nos esqueçamos que para extrair os metais é preciso furar a rocha e desfazê-la para que fique como farinha, o que requer enormes quantidades de energia. Por fim, depois de extrairmos o metal, ficam para trás literalmente montanhas de resíduos rochosos que incluem substâncias tóxicas como, por exemplo, arsénico e chumbo, assim com uma paisagem esventrada. Por isso é que a indústria dos automóveis elétricos é tão impactante no ambiente.
Solução ou não? Eis a Questão
Os carros elétricos têm sido apresentados como a solução (ou uma solução) para o impacto ambiental dos transportes, quanto na verdade são uma alternativa menos má. De facto, um carro elétrico acaba por ter menos emissões no seu ciclo de vida que um carro a gasóleo ou a gasolina, mas isso não significa que não tenha uma pegada ambiental. Na verdade, para cumprir os desígnios climáticos é inolvidável recorrer a medidas que façam reduzir o número de carros em circulação e a sua utilização. Tal envolve a expansão e melhoria do transporte público, incluindo transporte público on-demand, incentivos ao teletrabalho, e políticas criativas no estacionamento automóvel, na promoção dos modos suaves de mobilidade, na mobilidade partilhada, na fiscalidade dos combustíveis, nos subsídios à utilização do transporte público, e na utilização das vias de rodagem e gestão dos congestionamentos.
Em suma, os automóveis elétricos permitirão reduzir de sobremaneira a poluição urbana. São ainda necessários para reduzir as emissões de CO2, mas não são suficientes para resolver o problema no sector. São sim uma mera peça de um grande puzzle, que deve incluir uma gama abrangente de políticas públicas que conduzam a uma significativa menor utilização do automóvel privado.
A ZERO defende que:
– Devemos diminuir a utilização do automóvel privado e dar prioridade à utilização de transportes públicos e meios de mobilidade suave.
– Na inevitabilidade de ter de utilizar um carro, o carro elétrico em geral será a opção menos poluente que um carro convencional.
– Ao comprar um carro elétrico, tente optar por um em segunda mão, e que seja apenas grande o suficiente para as suas necessidades diárias.