Início » Custos do ruído do Aeroporto Humberto Delgado atingem valor astronómico de quase nove mil milhões de euros
Numa altura em que a atividade no aeroporto Humberto Delgado na Portela em Lisboa regista sucessivos recordes, com forte crescimento em comparação com 2022 e mesmo com o período pré-pandemia, aumentam em conformidade a incomodidade e o prejuízo para a saúde em cerca de 380.000 cidadãos de Lisboa, Loures e Almada provocados pelo excesso de ruído que esta infraestrutura origina em extensas áreas destes concelhos, um flagelo que traz elevados custos económicos para a sociedade e indivíduos. O grupo de trabalho para o estudo e avaliação do tráfego noturno neste aeroporto, constituído em 2020 por despacho governamental, já tinha calculado que estes custos entre as 23h00 e as 7h00 se tinham situado em 2019 nos 204 milhões de euros.
A ZERO avança agora com uma estimativa destes custos para o total das 24 horas do dia, lançando um contador no seu site(a) que mostra em tempo real o prejuízo acumulado da exposição crónica ao ruído na saúde dos cidadãos afetados (incomodidade, morbilidades, mortes prematuras) e em termos económicos (perda de produtividade no trabalho e na escola, subvalorização do património imobiliário) desde 2015, data em que o aeroporto deveria ter encerrado segundo o parecer de 2006 da Comissão de Avaliação Ambiental do plano de desenvolvimento(b) desta infraestrutura. Os custos aproximados acumulados neste período de sete anos e dez meses, a preços correntes, são superiores a 8.750 milhões de euros, o que significa, excluindo os anos de pandemia em que a atividade aeroportuária foi atípica, que estamos perante um prejuízo de cerca de 1.300 milhões de euros por ano, o que equivale a mais de três milhões e meio de euros por dia.
A ZERO lança ainda o filme ‘Inferno nos Céus: o impacto do ruído do Aeroporto Humberto Delgado na saúde dos cidadãos’, que mostra de forma evidente o grave problema que o ruído aeronáutico em Lisboa representa para os cidadãos, recorrendo a testemunhos na primeira pessoa.
A exposição prolongada ao ruído de aviões nas áreas afetadas da grande Lisboa tem várias consequências adversas na saúde, desde logo distúrbios do sono, interferindo na qualidade e na quantidade de descanso necessário para um funcionamento saudável do organismo. Além disso, faz aumentar os níveis de stress e contribui para problemas cardiovasculares, como hipertensão e doenças cardíacas. Os estudos mostram também que a saúde mental é prejudicada, podendo levar a distúrbios de ansiedade e depressão. Há ainda evidência científica clara de que o ruído de aviões afeta negativamente a função cognitiva, especialmente em crianças, interferindo no desenvolvimento intelectual e capacidade de aprendizagem. Em 2019, estes custos de saúde representaram 1.219 milhões de euros para os cidadãos afetados e Estado Português.
Em termos de produtividade escolar e no trabalho, o impacto do barulho dos aviões constante é também significativo na área metropolitana de Lisboa, podendo resultar em distração, diminuição da concentração, fadiga, redução geral no desempenho cognitivo e aumento da ansiedade entre os trabalhadores. A menor qualidade e quantidade do sono entre trabalhadores residentes nas zonas afetadas também reduz, em efeito de segunda ordem, a sua produtividade, quer trabalhem ou não nessas zonas. Além disso, a interferência constante do ruído de aviões pode dificultar uma comunicação eficaz, prejudicando a colaboração entre colegas ou na sala de aula. Os custos de perda de produtividade em 2019 representaram 45 milhões de euros.
O impacto do ruído dos aviões no mercado imobiliário de Lisboa e Loures é também considerável, pois os imóveis localizados em áreas sujeitas a altos níveis de ruído são subvalorizados, isto é, valorizam abaixo do seu potencial, uma vez que os compradores e inquilinos vêem-nos como menos atrativos. Em condições de tudo o resto constante, imóveis próximos do aeroporto ou debaixo da rota de voos têm em geral preços mais baixos em comparação com as restantes áreas da cidade. Esta subvalorização do património imobiliário terá custado 167 milhões de euros em 2019.
Uma vez que a atividade no aeroporto em 2023 ficará muito provavelmente acima da de 2019 em termos de número de voos (e passageiros), é possível adiantar que os custos este ano serão também de forma muito provável superiores aos aqui indicados.
No estudo avançado pela ZERO, o custo social que estas externalidades têm nos concelhos de Lisboa, Loures e Almada é quantificado usando uma metodologia presente em estudos internacionais e que se socorre de relações dose-efeito estabelecidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Mais concretamente, foram quantificados os custos associados às perturbações do sono, incomodidade, cardiopatia isquémica, hipertensão, perda de produtividade, subvalorização do património imobiliário (estes dois últimos fatores não foram avaliados pelo grupo de trabalho para o estudo e avaliação do tráfego noturno).
Os valores foram calculados em função dos critérios de exposição máxima estabelecidos pelo Regulamento Geral do Ruído (DL n.º 9/2007, de 17 de janeiro) para recetores sensíveis inseridos em zonas classificadas como zona mista, expressos em dois indicadores de ruído, Lden e Ln. Estes indicadores exprimem-se em dB(A) e representam as médias dos níveis sonoros num período de um ano, o Lden referente ao nível sonoro no período das 24 horas do dia (Lden≤65dB(A)) e o Ln ao período noturno das 23h00 às 7h00 (Ln≤55dB(A))[1].
Note-se, contudo, que a OMS recomenda valores mais baixos para estes indicadores (Lden≤45dB(A) e Ln≤40 dB(A)). A ZERO estima que os custos do ruído do aeroporto Humberto Delgado quando calculados ao abrigo das recomendações da OMS saiam significativamente agravados face aos custos apurados de acordo com a legislação nacional.
Em primeiro lugar, a ZERO considera que o valor da saúde humana e de um ambiente são e livre de ruído excessivo são supremos e não têm compensação possível por quaisquer ganhos monetários hipotéticos relacionados com a presença de um grande aeroporto dentro de uma cidade.
Segundo, dada a intensa crise habitacional que se vive na Área Metropolitana de Lisboa, é necessário assinalar que seria sempre duvidoso qualquer benefício advindo de um suposto aumento do número de turistas por via da proximidade do aeroporto ao centro da cidade.
Terceiro, de acordo com a uma análise estatística feita pela ZERO, no âmbito do acompanhamento do procedimento de Avaliação Ambiental Estratégica em curso, com base em dados do Eurostat para o período de 2009 a 2019 em mais de 75 aeroportos europeus, não existe qualquer correlação estatística entre a proximidade de aeroportos ao centro da principal cidade que servem e o crescimento de passageiros transportados nesse período[2].
De acordo com o último relatório da Comissão Técnica Independente, o tempo necessário para que pelo menos a primeira fase do futuro aeroporto de Lisboa possa estar concluída é de cinco a sete anos, o que significa, para os atuais níveis de afetação do atual aeroporto, 6.500 a 9.100 milhões de euros de custos sociais acrescidos aos já contabilizados.
Desde 1990, pelo menos seis grandes aeroportos dentro ou muito próximo de grandes cidades europeias foram relocalizados, desativados ou viram a sua atividade reduzida a níveis residuais, nomeadamente em Munique (1992), Oslo (1998), Atenas (2001), Berlim (Tempelhof em 2008 e Tegel em 2020) e Istambul (2022).
Está na hora de fazer o mesmo em Lisboa, e por isso a ZERO espera que, na sequência da Avaliação Ambiental Estratégica em curso, se inicie a contagem decrescente para o encerramento urgente e definitivo do Aeroporto Humberto Delgado, acabando de vez com os seus custos sociais incomportáveis – estes custos, só desde 2015, dariam para pagar, pelo menos, dois novos aeroportos em local adequado com o menor impacto possível sobre a saúde humana, e quando encerrar, esta infraestrutura somará várias dezenas de milhões de euros em prejuízo irrecuperável para os cidadãos afetados.
(b) https://siaia.apambiente.pt/AIADOC/AIA1529/Parecer CA Final1529.pdf
[1] Nota metodológica (Anexo I) aqui.
[2] Informação completa com a análise estatística (Anexo II) aqui.
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