Início » ZERO quer reformulação da expansão da Linha Vermelha do Metro em Lisboa
Terminou ontem o período de discussão pública do Relatório de Conformidade Ambiental do Projeto de Execução (RECAPE) da expansão da Linha Vermelha do Metropolitano de Lisboa, entre São Sebastião e Alcântara, para o qual a ZERO contribuiu, e sem o qual o projeto não pode avançar.
Extremamente preocupada com a insuficiência de medidas eficazes para reduzir a emissão de gases com efeito de estufa no setor dos transportes em 5% ao ano até 2030 como exigido no Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC) de descer as emissões nos transportes em 40% face a 2005, a ZERO considera que este plano de expansão da Linha Vermelha, na sua forma atual, não conseguirá atingir a redução de emissões que seria possível e necessária, nem promoverá um aumento significativo na utilização de transporte público na Área Metropolitana de Lisboa, nomeadamente nos seus concelhos mais ocidentais.
Este RECAPE procura dar cumprimento, mas sem integral sucesso, à Declaração de Impacte Ambiental (DIA) emitida sobre um estudo prévio, que ignorou de forma ostensiva o potencial dos interfaces da linha vermelha com as linhas de comboio de Setúbal (Fertagus) e de Cascais no futura estação de comboio do Alvito, e sobretudo a enorme mais-valia que constituiria o interface com a estação de comboio de Campolide enquanto nó fundamental da rede ferroviária metropolitana. Este interface permitiria transportar de comboio mais 30 a 45 mil passageiros por dia, mesmo antes de qualquer melhoria nos sistemas de sinalização, promovendo uma importante transferência modal e podendo reduzir as emissões em cerca de 190 kt de CO2eq (dióxido de carbono equivalente), o que corresponde a mais de 1% de todas as emissões do setor dos transportes em Portugal registadas no último ano.
O atual projeto prevê que, no seu melhor cenário, deixem de circular apenas 3.500 veículos por dia, resultando numa redução estimada de emissões de 16 kt de CO2 eq – o que equivale a apenas 0,09% das emissões nacionais do setor dos transportes. Apesar de representar uma redução importante, este valor não é proporcional ao enorme investimento de mais de 400 milhões de euros. Estes recursos poderiam ser mais eficazmente aplicados em alternativas que ofereçam uma maior redução de emissões de carbono, como a eletrificação da frota de autocarros e da logística urbana. A manter-se este rácio entre investimento e emissões reduzidas, a ZERO alerta que precisaríamos de investir em média e 18.000 milhões de euros por ano, a preços atuais, para cumprir os objetivos de emissões no setor dos transportes até 2050, o que sendo irrealizável demonstra a inviabilidade financeira deste investimento do ponto de vista da redução de emissões no setor dos transportes.
A criação de um interface em Campolide é crucial para melhorar a capacidade operacional da Linha de Cintura, descentralizando o fluxo de passageiros e permitindo um aumento na frequência dos serviços suburbanos de Setúbal, Cascais e Sintra. Esta infraestrutura fortaleceria a resiliência da rede ferroviária e melhoraria a intermodalidade, favorecendo a distribuição do tráfego e reduzindo a saturação nas estações de Sete Rios e Entrecampos, essenciais para o bom funcionamento do sistema de transporte metropolitano.
Além disso, uma estação de metro em Campolide permitirá servir, através de acessos cobertos dedicados, a importantes polos geradores de tráfego como o Palácio da Justiça e o Polo da Universidade NOVA de Lisboa.
De forma semelhante, o futuro interface de Chelas/Olaias com a linha vermelha desempenhará um papel crucial na flexibilidade e resiliência da rede ferroviária no lado oriental da cidade. Ambos os interfaces, Campolide no lado ocidental e Chelas/Olaias no lado oriental, são essenciais para descongestionar o troço entre Sete Rios e Areeiro, garantindo maior capacidade e frequência nos serviços ferroviários.
A proposta de traçado da Linha Vermelha, semelhante à prevista no Plano de Expansão de 2009 do ML, apresenta uma extensão no traçado de cerca de 3,6 Km, mais curta do que o projeto atual, que tem uma extensão de 4,1 Km. Esta redução na extensão permite custos de investimento mais baixos. O esboço apresentado mostra os acessos mecânicos aos principais polos geradores de tráfego, com declives menos acentuados e um número reduzido de curvas, reduzindo os custos operacionais a médio e longo prazo. |
A expansão até Alcântara prevê a construção de um viaduto de 159 metros, o que gera preocupações significativas em relação aos impactos numa paisagem urbana com valor patrimonial de relevo. A ZERO considera que a localização do viaduto no vale de Alcântara, a norte da atual estação ferroviária de Alcântara-Terra, como previsto no plano original de 2009, reduziria o impacto na zona histórica, respeitando o Plano de Pormenor de Alcântara. Não é claro que a Estação de Alcântara prevista neste RECAPE permita que o interface Alvito – Alcântara ML – Alcântara-Terra funcione com tempos de comutação aceitáveis e comporte a extensão em túnel para a parte ocidental da cidade até Miraflores, em Oeiras, beneficiando freguesias densamente povoadas com tempos de viagem em transporte público mais reduzidos e promovendo um acesso mais eficiente a infraestruturas essenciais, como o Polo Universitário da Ajuda e o Hospital São Francisco Xavier. Esta extensão garantiria uma cobertura mais abrangente e inclusiva do transporte público.
Numa altura em que se encontra em curso a Avaliação Ambiental Estratégica do Plano Metropolitano de Mobilidade Sustentável da Área Metropolitana de Lisboa (PMMUS) e que deveria enquadrar os investimentos estruturantes no setor dos transportes a nível metropolitano, seria incompreensível que se adotasse um plano de expansão da linha Vermelha, obsoleto, e que condiciona negativa e fortemente as opções do PMMUS, que é crucial para acelerar a redução urgente do uso do transporte individual e promover uma mudança do modelo de mobilidade consistente com o combate à crise climática. O prolongamento da Linha Vermelha tal como está atualmente concebido compromete as futuras opções de mobilidade urbana sustentável para Lisboa. A decisão de não construir um interface em Campolide enfraquece a intermodalidade, dificultando a integração eficiente entre o metro e a rede ferroviária nacional e criando obstáculos para futuras expansões da rede de transportes públicos. Isto contraria os objetivos do PMUS da Área Metropolitana de Lisboa de promover uma mobilidade sustentável, inclusiva e integrada.
Acresce que o Plano Diretor Municipal (PDM) entrará também em fase de revisão e este traçado e estações, que à luz do atual PDM são ilegais, condicionam de forma definitiva as opções dos planeadores e dos vereadores e deputados eleitos.
Este projeto datado, concebido para um cenário em que o Aeroporto Humberto Delgado se manteria, é resultado do inexplicável abandono do Plano de Expansão de 2009, que previa estações em Campolide e no Alvito, cruciais para a criação de interfaces eficientes para o sistema de transportes. Sem esses elementos de descongestionamento, as estações de Sete Rios e Entrecampos continuarão sobrecarregadas, aumentando os tempos de espera e asfixiando a capacidade da Linha de Cintura. Isso limitará a circulação de mais comboios vindos das linhas de Setúbal, Cascais e Sintra, que atendem mais de metade da população da Área Metropolitana de Lisboa, e dificultará a criação de serviços ferroviários com destino ao novo aeroporto de Lisboa, a partir de Sete Rios que cruzam todas as linhas de Metro atualmente existentes, reduzindo assim o potencial de acesso em transporte público à nova infraestrutura aeroportuária que terá que ser uma prioridade fundamental.
O projeto falha na proteção de áreas sensíveis do ponto de vista ambiental e patrimonial, como Alcântara, a Tapada das Necessidades e o Jardim da Parada, não existindo neste último caso, aparentemente, quaisquer medidas que permitam mitigar o elevado risco de degradação do solo a nível radicular no período de exploração que foi apontado na DIA como um impacto negativo, significativo e irreversível. As medidas de mitigação propostas são vagas e insuficientes, colocando em risco a integridade de áreas verdes e património histórico.
Estranhamente, e na visão da ZERO contrariando a Declaração de Impacte Ambiental, o Metropolitano de Lisboa anunciou na sessão pública realizada em Campo de Ourique que iria realizar os estudos geológicos e hidrogeológicos necessários depois da emissão definitiva da licença ambiental, quando eles deveriam ser realizados para fundamentar o RECAPE.
A ZERO insta a que se proceda a uma revisão profunda do projeto, assegurando, ao contrário do atual projeto de traçado, o cumprimento das normas ambientais e urbanísticas e a promoção de uma mobilidade verdadeiramente inclusiva e sustentável, com base no Plano de Expansão da Rede de Metropolitano de Lisboa de 2009.
A ZERO apela à reformulação da expansão da Linha Vermelha, retomando o Plano de 2009, incluindo a estação de Campolide como interface estratégico e integrando as linhas de Setúbal, Cascais, Sintra e uma rede de elétricos para melhor servir o centro da cidade. Os mais de 400 milhões de euros previstos para esta obra poderiam ser mais eficazmente utilizados, do ponto de vista da mitigação das alterações climáticas, na eletrificação da frota de autocarros e da logística urbana ao abrigo do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), com um impacto mais significativo na redução das emissões de gases com efeitos de estufa e na melhoria da mobilidade na Área Metropolitana de Lisboa.
A implementação de um plano integrado e ambicioso é essencial para que Lisboa alcance as suas metas de descarbonização e desenvolva uma rede de transportes moderna e eficiente. A reformulação do projeto deve focar-se em maximizar a intermodalidade, melhorar a conectividade e assegurar um uso mais eficaz dos recursos públicos, promovendo uma verdadeira transição para uma mobilidade mais verde e inclusiva.
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