Início » Parecer relativo ao Calendário e Programa de Trabalhos dos PGRH do 4.º Ciclo
A ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável, com base na consulta do documento disponibilizado no Portal Participa, vem por este meio apresentar o seu parecer relativo ao Calendário e Programa de Trabalhos dos PGRH do 4.º Ciclo.
O documento em apreço constitui o ponto de partida para o 4.º ciclo de planeamento dos Planos de Gestão de Região Hidrográfica (PGRH), no âmbito da implementação da Diretiva-Quadro da Água (DQA) em Portugal. A sua estruturação e o esforço de alinhamento com os requisitos legais e operacionais nacionais e europeus são meritórios. Reconhece-se a importância estratégica deste instrumento para garantir a boa governança da água em Portugal, num contexto agravado pela escassez, alterações climáticas e pressões antropogénicas crescentes. O seu conteúdo está tecnicamente bem estruturado, com uma clara calendarização das fases de trabalho, articulação institucional e mecanismos de participação pública.
É de saudar a valorização da participação pública alargada, a integração com políticas transfronteiriças (CADC) e o alinhamento com os compromissos europeus, como o Pacto Ecológico Europeu e a Estratégia de Biodiversidade da UE para 2030.
O documento apresenta clareza metodológica e cronológica, ao estabelecer um cronograma bem definido e estruturado, com uma visão a longo prazo que facilita a articulação entre as diversas entidades e atores relevantes envolvidos no processo. Destaca-se também a integração da Avaliação Ambiental Estratégica (AAE), cuja realização paralela aos Planos de Gestão de Região Hidrográfica (PGRH) e aos Planos de Gestão de Riscos de Inundações (PGRI) contribui decisivamente para assegurar a coerência e a eficiência do planeamento. No plano normativo, observa-se uma forte abrangência e coerência, uma vez que o documento incorpora os principais instrumentos legais, tanto a nível nacional como europeu, reforçando a importância da articulação entre políticas setoriais. Por fim, salienta-se a promoção de soluções baseadas na natureza como uma medida relevante para o reforço da resiliência climática, em linha com as mais recentes recomendações da Agência Europeia do Ambiente (EEA) e também com a Lei do Restauro da Natureza.
Apesar da robustez estrutural, identificam-se aspetos a melhorar para garantir uma maior eficácia, legitimidade democrática e relevância socioambiental do planeamento. Abaixo apresentam-se os principais pontos críticos acompanhados de sugestões operacionais:
O documento apresenta uma lógica processual correta, mas carece de metas claras e mensuráveis que permitam avaliar a eficácia das ações propostas. O ciclo 2028–2033 deve ter uma arquitetura de metas SMART (específicas, mensuráveis, alcançáveis, relevantes e temporais).
Sugestão:
Incluir, em anexo ao Calendário e Programa de Trabalhos, uma tabela com objetivos ambientais por região hidrográfica, acompanhada de indicadores-chave de desempenho (KPIs), tais como:
– Percentagem de massas de água com bom estado ecológico previsto para 2033;
– Meta de redução de perdas nas redes de abastecimento público (%);
– Metas para o volume anual de água reutilizada por setor (hm³);
– Metas para a área de zonas húmidas restauradas ou protegidas (ha).
Apesar da referência às alterações climáticas e à escassez hídrica, o documento não apresenta uma diferenciação estratégica entre regiões, nem identifica os grupos populacionais mais vulneráveis.
Sugestão:
Introduzir uma abordagem de planos sub-regionais com prioridade à adaptação climática, especialmente no Alentejo e Algarve. Devem ser previstos fundos e medidas específicas para os pequenos utilizadores, comunidades rurais e municípios com maior stress hídrico.
Embora se reconheça o esforço em ampliar a participação, a estrutura proposta continua fortemente assente nas entidades públicas e utilizadores organizados (ONG, municípios, setores económicos).
Sugestão:
Investir numa participação mais inclusiva, descentralizada e acessível, recorrendo a mediadores territoriais ou laboratórios de território (pilotos participativos com comunidades locais), tecnologias digitais participativas e envolvimento de comunidades locais de base.
Apesar de se referirem as alterações climáticas, o documento não capitaliza suficientemente a experiência de eventos extremos recentes (como as secas prolongadas de 2022–2023) para justificar mudanças estruturais urgentes na governação da água nem apresenta um modelo de revisão dinâmica dos planos.
Sugestão:
Reforçar a aprendizagem adaptativa e a necessidade de revisão dinâmica das medidas com base em eventos críticos recentes, garantindo maior flexibilidade e capacidade de resposta do PGRH com atualização das medidas em função de novas evidências, indicadores ou impactos imprevistos. Desenvolver programas de educação participativa nas escolas e universidades, com desafios e hackathons sobre uso sustentável da água.
O documento representa um avanço importante para a estruturação do 4.º ciclo de planeamento da água em Portugal. Contudo, para que o plano tenha impacto real e duradouro, será necessário ir além do cumprimento formal da DQA e promover uma transição hídrica justa, sustentável e centrada nas pessoas.
Importa recordar que Portugal foi já alvo de vários alertas e processos de infração por parte da Comissão Europeia, devido a atrasos significativos na elaboração, revisão e implementação dos PGRH em ciclos anteriores. A título de exemplo, os PGRH do 3.º ciclo (2022–2027) só foram aprovados em finais de 2023 e inícios de 2024, muito além do prazo exigido pela Diretiva-Quadro da Água (dezembro de 2021). Estes atrasos comprometem a implementação atempada de medidas de gestão da água e afetam o desempenho de Portugal nos indicadores ambientais da UE.
Neste contexto, o sucesso do 4.º ciclo depende não apenas da qualidade técnica do planeamento, mas sobretudo da execução rigorosa do calendário proposto, da disponibilização atempada dos instrumentos e relatórios, e da responsabilização clara das entidades competentes. A Comissão Europeia tem sido clara na sua expectativa de que os Estados-Membros cumpram as obrigações legais da DQA em matéria de prazos, transparência, metas e articulação com os sistemas de reporte europeu (como o WISE – Water Information System for Europe).
As sugestões apresentadas neste parecer — nomeadamente a introdução de metas quantificáveis, reforço da participação cidadã, diferenciação territorial e criação de mecanismos de revisão dinâmica — visam precisamente garantir que Portugal não volta a incorrer nos erros do passado e assegura uma governação da água à altura dos desafios climáticos, ecológicos e sociais que enfrenta.
Solicita-se, por isso, que estas recomendações sejam consideradas na revisão do documento e integradas nos relatórios de participação pública a publicar pela APA.
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