Início » A União Europeia vai rever os critérios de sustentabilidade para a queima de biomassa como energia renovável ao abrigo da Diretiva das Energias Renováveis (REDII)
Critérios de (in)sustentabilidade fazem com que a utilização de biomassa florestal não ajude a enfrentar a crise climática.
Numa altura em que a União Europeia está a rever a revisão da Diretiva das Energias Renováveis (REDII), a ZERO conjuntamente com a ClientEarth e com outras ONG de França, Reino Unido, Finlândia e Estónia divulgaram o relatório “Insustentável e Ineficaz: Porque é que as Normas de Biomassa Florestal da UE não param a destruição” [1], o qual salienta as fragilidades do atual quadro legal e o porquê da necessidade de uma urgente revisão da política europeia.
O enquadramento da biomassa na política da EU desta Diretiva, num momento em que alguns países, onde se inclui Portugal, ainda não fizeram a sua transposição para a legislação nacional, baseia-se na ideia demasiado simplista de que a biomassa pode ser uma fonte de energia renovável que pode reduzir as emissões de gases com efeito de estufa sem prejudicar as florestas. Contudo e para que isto comece a ser verdade, para além de ser necessário uma urgente revisão.
Para assegurar que a biomassa florestal seja positiva para o clima, os critérios REDII exigem apenas que os países façam parte no Acordo de Paris; que tenham em vigor regras de utilização do solo, uso do solo, alteração do uso do solo e floresta (LULUCF); e que as suas florestas são um sumidouro líquido de dióxido de carbono. Isto faz com que a esmagadora maioria de países que fornecem biomassa estejam em conformidade, mas não conseguem prevenir a queima de biomassa que prejudica o clima [2].
Mas há mais aspetos que colocam dúvidas sobre a aplicabilidade da futura legislação:
A diretiva define que apenas as avaliações e relatórios elaborados pelas organizações governamentais nacionais ou internacionais são legíveis como fontes de prova para avaliar a aplicação da lei, sendo caricato que a recolha de informação seja feita pelas autoridades responsáveis pela aplicação da lei – autoridades estatais envolvidas na gestão florestal, relegando para a irrelevância o papel vital [4] que as Organizações Não Governamentais (ONG) que desempenham na monitorização e garantia do cumprimento da legislação ambiental da UE.
Portugal é um exemplo de como a existência de legislação não é sinónimo de sustentabilidade.
O cenário em Portugal
No que respeita à sustentabilidade na utilização de biomassa florestal para produção de energia, a legislação portuguesa prevê a necessidade de um plano de ação para 10 anos visando a sustentabilidade a prazo do aprovisionamento das centrais, a existência de um sistema de registos de dados que permita identificar as fontes do aprovisionamento e consumos da central, identificando nomeadamente o tipo e as características da biomassa consumida. Os dados obtidos serviriam para avaliar, auditar e fiscalizar a tipologia da biomassa consumida nas centrais, auxiliando na definição de produtos que podem ser considerados biomassa florestal residual. Contudo, a portaria prevista apresenta um atraso de 10 anos na sua publicação.
Verifica-se assim que continua a não existir um sistema de monitorização que permita de forma séria e credível identificar e rastrear o tipo de biomassa que está a ser queimada nas centrais de biomassa a nível nacional, uma vez que os manifestos de corte que obrigatoriamente têm de ser entregues junto do ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, não passam de meras intenções de intervenção e poderão não mostrar a verdadeira realidade relativamente ao material que está a ser extraído da floresta e encaminhado para a valorização energética.
Para além disso, continuamos a assistir ao implementar de uma política energética alegadamente como forma de redução dos riscos associados, com a dinamização do mercado dos sobrantes florestais e indiretamente o fomento das boas práticas de gestão e exploração florestal sustentável, mas na qual falta o essencial: uma verdadeira avaliação do potencial de verdadeiros resíduos florestais passíveis de serem utilizados sem colocar em causa as funções ecológicas dos ecossistemas, assim como o aprovisionamento das outras indústrias que fazem destes a sua matéria-prima.
Assistimos à incapacidade que as entidades públicas com responsabilidades têm para fiscalizar e fazer cumprir a legislação no que respeita não só à utilização sustentável da biomassa florestal, assim como o garantir da saúde e bem-estar da população que reside nas proximidades de centrais de biomassa, como é exemplo flagrante a Central do Fundão que vivem num constante “inferno” com o ruído, pó, cinzas e cheiro. Inexplicavelmente, o promotor vem protelando os prazos para conclusão das intervenções que alegadamente vão mitigar os problemas de ruído que afetam os residentes nas imediações.
Assim, a ZERO espera que o Governo:
Notas:
[1] Link para relatório: https://www.fern.org/publications-insight/unsustainable-and-ineffective-why-eu-forest-biomass-standards-wont-stop-destruction-2348/
[2] European Commission, JRC report – The use of woody biomass for energy production in the EU: https://publications.jrc.ec.europa.eu/repository/handle/JRC122719.
[3] “The certification schemes still come with some principal limitations to be handled […] one key issue is the challenge of monitoring, disclosure and enforcement”. ECOFYS, Milieu & COWI, Feasibility study on options to step up EU action against deforestation, 2018. p.128. Greenpeace International, “Destruction: Certified”, https: https://www.greenpeace.org/static/planet4-international-stateless/2021/04/b1e486be-greenpeace-international-report-destruction-certified_finaloptimised.pdf, and “Not Fit For Purpose”.
[4] Communication from the Commission of 28 April 2017 on Access to Justice in Environmental Matters, par. 38.
[5] EU Green Deal Communication: COM (2019) 640 final, point 2.2.5.
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