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Com o Projeto Biomassa, a ZERO tem chamado a atenção para a insustentabilidade da queima da biomassa florestal para produção de energia, considerando que os governos devem investir em fontes de energia verdadeiramente renováveis, como a solar e a eólica. A queima de “biomassa lenhosa primária”, isto é, troncos retirados diretamente da floresta com o objetivo de queimar para produção de eletricidade ou produzir pellets para produção de energia ou aquecimento, contribui para o aumento das emissões e para a redução da capacidade de sumidouro de carbono das florestas.
Ao longo dos últimos sete anos, a ZERO em parceria com organizações não governamentais de todo mundo, vem alertando para a insustentabilidade resultante da queima de madeira para fins energéticos [1].
A biomassa florestal é um importante recurso endógeno, pelo que a valorização energética, em determinadas condições, é uma solução que contribui para a quota de energia de fontes renováveis. Contudo, a aposta política europeia na utilização da biomassa florestal primária para a produção de eletricidade, em grande medida, impulsionada pela Diretiva das Energias Renováveis, não tem acautelado a utilização sustentável das florestas.
É um facto que muitas centrais de biomassa para produção de eletricidade e fábricas de pellets na União Europeia estão a utilizar árvores retiradas diretamente das florestas, apesar de afirmarem categoricamente que utilizam como fonte de combustível, resíduos florestais e resíduos da indústria da madeira como a serradura e costaneiras.
Um relatório de 2021 do European Commission’s Joint Research Centre [2] identificou a queima de árvores e os restos de madeira com alguma dimensão, deixados após o corte, como um cenário de perda para a natureza e o clima. Globalmente, a queima de madeira da UE emite mais de 311 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2) por ano, o equivalente às emissões de gases com efeito de estufa comunicadas por Espanha. Apesar destas emissões, a política da UE trata a queima de madeira como “zero emissões” de carbono e permite aos Estados-membros subsidiar a queima de madeira. A subsidiação europeia para toda a utilização de biomassa, incluindo a queima de madeira, ronda os cerca de 17 mil milhões de euros por ano.
Outro ponto importante em toda esta discussão, prende-se com o facto de a valorização energética de biomassa ser considerada, numa perspetiva de gestão florestal, como uma forma de prevenção de incêndios florestais, mas não encontramos uma clara ligação entre a política florestal e a estratégia energética. Embora o Decreto-Lei n.º 5/2011, que estabelece medidas destinadas a promover a produção e o aproveitamento de biomassa florestal, procure efetuar uma ligação entre a estratégia nacional para as florestas aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 114/2006, de 15 de Setembro, e na altura a estratégia para a energia com o horizonte de 2020 (ENE 2020), pouca ligação se constata para além de um estabelecimento de um incentivo económico à atividade. De certa forma, esta legislação tinha como objetivo bonificar o pagamento da eletricidade produzida em centrais dedicadas a biomassa, mediante um conjunto de deveres, os quais na nossa opinião podem não estar a ser cumpridos. Falamos por um lado da necessidade de aprovação de um plano de ação para 10 anos visando a sustentabilidade a prazo do aprovisionamento das centrais, dos quais existem muitas dúvidas quanto à sua aprovação para as 15 centrais de biomassa em funcionamento. Para além disso, uma legislação que não é suficientemente robusta e ambiciosa quanto à obrigatoriedade de valorizar energicamente somente verdadeiros resíduos. A possibilidade de queima de troncos, mesmo de segunda, que poderiam ser direcionados para outras indústrias é real.
Acresce que, existe uma indústria de produção de pellets de madeira que é completamente insustentável na medida em que utilizam madeira descascada para a produção de grandes quantidades de pellets que vão ser na sua maioria ser exportados para países como a Dinamarca, Países Baixos e Reino Unido, onde são queimados em centrais ineficientes com um alegado selo de neutro em carbono e renovável.
Olhando para os dados estatísticos publicados pela Direção Geral de Energia e Geologia, constata-se que a produção de eletricidade a partir de biomassa ocupará neste momento o quarto lugar no ranking das energias renováveis, ultrapassada pela produção fotovoltaica sobre a qual tem-se assistido a um incremento nos últimos anos. A produção de eletricidade a partir de biomassa corresponde a cerca de 10% da produção de energias renováveis, mas se analisarmos a produção nacional considerando fontes renováveis e não renováveis, o valor desce para os 7%.
Quanto aos materiais utilizados, segundo a informação da DGEG, o consumo de biomassa para a produção de energia elétrica pode ser desagregada nas seguintes tipologias:
É claro que nesta classificação fica sempre a dúvida quanto a alguma rolaria, isto é, troncos que são encaminhados para as centrais de biomassa, que dificilmente na nossa opinião deveriam ser classificadas como resíduos, tendo em consideração que são matéria-prima utilizada em outras indústrias, como por exemplo a dos painéis e aglomerados de madeira.
O relatório sobre a Biomassa em Portugal (2021) [3] e o Barómetro Anual Pellets de Madeira 2022, [4] é perentório nos números apresentados. Em 2021 mais de 1,5 milhões de toneladas de madeira foram usadas para produzir pellets em Portugal. A produção de pellets foi responsável por cerca de um quinto de todo o consumo de madeira de pinho, mas representando apenas 3% do valor de exportação dos produtos à base de madeira de pinho. Por conseguinte as pellets não são mais que uma mercadoria de alto impacto e baixo valor. No caso das centrais de biomassa, para o potencial instalado existe uma necessidade de mais de 3 milhões de toneladas ano, de biomassa florestal.
O relatório publicado pela Partnership for Policy Integrity (PFPI) [5] mostra que a União Europeia, incluindo Portugal, está a perder os seus sumidouros de carbono florestal a um ritmo alarmante, e o aumento do corte de florestas para produção de energia de forma a atingir as metas de energias renováveis é uma das principais razões para tal.
Com base em dados governamentais sobre a utilização de biomassa e o estado atual do sumidouro de carbono nos Estados-Membros da UE, contata-se que a queima da floresta, um importante aliado no sequestro de carbono, revela como a política de biomassa florestal da UE está a minar o clima, o restauro da natureza e os objetivos de qualidade do ar.
Torna-se importante:
[1] https://forestdefenders.eu
[3] link para relatório da biomassa: https://zero.ong/wp-content/uploads/2023/02/A_Biomassa_em_Portugal.pdf
[4] link para o barómetro: https://zero.ong/wp-content/uploads/2022/06/barometro-2022-pt-.pdf
[5] Link para o relatório: https://forestdefenders.eu/wp-content/uploads/2022/11/PFPI-Burning-up-the-carbon-sink-Nov-7-2022.pdf
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