Seca no Algarve: um problema que exige soluções urgentes e integradas.
O Algarve é uma das regiões mais afetadas pela seca em Portugal, que se agravou nos últimos anos devido às alterações climáticas, à elevada pressão turística e à falta de planeamento e gestão dos recursos hídricos. Atualmente, é uma região que se vê numa situação de seca extrema e severa, com as reservas de água a atingirem níveis críticos, os aquíferos sobreexplorados e poluídos, os agricultores com água racionada, os ecossistemas em risco e uma população que teme ficar sem água nas torneiras.
Este é um cenário dramático e que exige medidas urgentes e integradas por parte do Estado, das entidades gestoras, dos vários setores utilizadores de água e da sociedade civil, que garantam a segurança hídrica da região e a sua sustentabilidade ambiental, social e económica.
Para fazer face a esta situação, o Governo anunciou recentemente medidas de “resposta imediata” para reduzir os consumos e racionalizar a água, como cortes de 25% na agricultura e de 15% no setor urbano, que inclui o turismo.
Contudo, estas medidas são insuficientes e tardias, pois não resolvem o problema estrutural da falta de água no Algarve. É urgente ter uma estratégia que inclua soluções de longo prazo, que garantam a sustentabilidade hídrica da região. Uma das soluções que tem sido debatida é a chamada “autoestrada da água”, que consistiria em transportar água das albufeiras do norte do país para o sul, através de um sistema de canais e condutas.
Esta ideia, que à primeira vista pode parecer lógica, é na verdade uma má decisão, seja pelos custos elevadíssimos que lhe estariam associados e que seriam em grande parte suportados pelos contribuintes e pelos consumidores de água, que iriam ver as suas faturas da água disparar seja porque, do ponto de vista ambiental, seria desastroso com consequências irreversíveis para os ecossistemas com a destruição de habitats e a perda de biodiversidade. A autoestrada da água iria deixar o Algarve dependente da disponibilidade de água no norte do país que, tal como se viu em 2022, também está sujeito a períodos de seca e escassez capazes de deixar as albufeiras em níveis mínimos de armazenamento.
A seca no Algarve é um desafio que exige uma resposta urgente e adequada, que não pode ser baseada em soluções ilusórias e irresponsáveis, como a autoestrada da água. É preciso optar por soluções inteligentes e sustentáveis, que assegurem o futuro da região e do país e que garantam um impacto positivo na preservação dos recursos hídricos, na proteção do ambiente e na garantia do bem-estar das populações.
Algumas dessas medidas são:
- A redução do consumo de água, através da implementação de tarifas em função dos consumos e que permitam às entidades gestoras recuperar, se não a totalidade, pelo menos uma parte significativa dos gastos com a prestação do serviço, permitindo-lhes fazer investimentos na rede de distribuição para combate às perdas;
- A criação de incentivos à instalação de equipamentos de eficiência hídrica em edifícios como os destinados à reutilização de águas cinzentas ou ao aproveitamento de águas pluviais;
- A melhoria da gestão da água, através da monitorização e do controlo da qualidade e da quantidade da água disponível, da articulação entre os diferentes níveis de planeamento e de intervenção, da participação e da informação dos utilizadores e da sociedade e da promoção de uma cultura de responsabilidade e de cidadania hídrica;
- A limitação da expansão de áreas de regadio, através da definição de zonas prioritárias e de critérios de elegibilidade para o apoio público ao regadio, tendo em conta a disponibilidade e a qualidade da água, o tipo de cultura e o impacto ambiental;
- A promoção de uma agricultura sustentável, através da diversificação das culturas, da adoção de práticas de agricultura de conservação, da redução do uso de fertilizantes e fitofármacos, da valorização dos produtos locais e da certificação da qualidade ambiental;
- A contenção da expansão urbana, através da revisão dos planos diretores municipais e dos planos de ordenamento do território, da aplicação de taxas e de incentivos à reabilitação urbana, da proteção das áreas rurais e naturais e da promoção da mobilidade sustentável.
Estas medidas devem ser tomadas de forma articulada e integrada, tendo em conta as especificidades e as necessidades da região, os interesses e os direitos dos diferentes utilizadores e a preservação e a valorização dos recursos hídricos e dos ecossistemas. Só assim será possível enfrentar o desafio da seca, seja no Algarve ou em qualquer outra região do país, e garantir um futuro mais sustentável e mais justo para todos.
Sara Correia.