Será o biológico mais saudável?
Os produtos com origem na agricultura biológica estão cada vez mais presentes nos nossos mercados, seja nas grandes superfícies comerciais seja nos pequenos estabelecimentos de bairro. Mas o que significa na verdade o termo biológico? E será que o biológico é realmente mais saudável? De facto, ao comprarmos biológico, o risco de nos expormos a elementos químicos é menor, mas a garantia não é total e, para além disso, não significa que o impacto ambiental destes produtos seja menor. Eis mais uma questão complexa, descomplicada.
O que significa biológico?
Há duas formas de olharmos para a agricultura biológica. Uma delas centra-se em princípios mais abrangentes que englobam não apenas a regulação do uso de químicos, mas também o impacto ambiental ou o comércio justo. Por exemplo, a Federação Internacional de Movimentos de Agricultura Biológica define que a agricultura biológica se deve reger sob quatro princípios:
- Saúde: deve produzir alimentos que contribuam para o bem-estar dos ecossistemas, animais e plantas que estão, por sua vez, intimamente ligados à saúde do homem;
- Ecologia: deve procurar manter a diversidade genética e agrícola e a preservação dos recursos naturais;
- Justiça: deve respeitar a qualidade de vida de todos os intervenientes e combater a pobreza;
- Precaução: deve ser responsável e transparente no desenvolvimento de novos métodos e tecnologias aplicáveis à agricultura biológica.
Numa outra perspetiva, podemos olhar a agricultura biológica como um sistema de regulamentação e certificação da aplicação de normas em matéria de bem-estar dos animais e método de produção obtidos utilizando substâncias e processos naturais.
Em Portugal, o controlo oficial da produção biológica é regulamentado pelo Plano de Controlo em Regimes de Qualidade (Produção Biológica) – PNCP, coordenado pela Direção Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural (“DGADR”). Este controlo incide sobre as fases de produção, preparação, distribuição, importação e colocação dos produtos biológicos à disposição do consumidor final. A verificação destas práticas cabe a organismos de controlo reconhecidos pela DGADR, que verifica avalia os sistemas de controlo através de uma supervisão anual. Além disso, o controlo da comercialização dos produtos biológicos é assegurado pela Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (“ASAE”).
É mais saudável?
Quando nos perguntamos se “é mais saudável” temos que identificar “em relação a quê”. Dentro do universo de produtos sem certificação cabem práticas diversas, algumas poderão ser consonantes com o normativo do modo de produção biológico (“MPB”). A certificação em MPB é, no entanto, um maior garante de que certos requisitos e práticas foram respeitados, através de procedimentos de controlo. Sendo o normativo comum em toda a Europa, existe segurança de que produtos com o selo de certificação respeitaram as mesmas regras independentemente do país de origem, desde que dentro da União Europeia.
Ainda que o MPB estipule bases para uma agricultura integrada no ecossistema, isto pode não acontecer na prática, uma vez que os organismos de controlo não fazem uma avaliação do impacto ambiental. Pode ocorrer que a instalação de um sistema agrícola, mais tarde certificado em MPB, tenha levado à destruição de habitats protegidos ou à violação de instrumentos de gestão territorial. O mesmo ocorre no que toca ao salário justo e condições dos trabalhadores agrícolas, que estão fora do alcance da certificação, embora sejam princípios dos Movimentos de Agricultura Biológica.
Também podem ocorrer exceções, que permitem a introdução no sistema agrícola certificado de produtos não oriundos de agricultura biológica, como sucede em situações de seca severa que limitou a produção natural das pastagens, levando os produtores a terem que recorrer a rações não certificadas em MPB.
Por fim, os organismos de controlo são, sobretudo, empresas privadas, cuja fonte de receita advém dos produtores que controlam. Apesar da existência de uma supervisão robusta, este possível conflito de interesses pode levar a lacunas no controlo.
A ZERO defende que:
– Se procura alimentos mais saudáveis, o ideal seria conhecer o local e os processos de produção, quer pelo envolvimento direto nestes processos ou por um conhecimento próximo do produtor. Existem organizações de produtores e consumidores, como as AMAP e CSA, que fazem esta ponte através do que designa por sistemas participados de garantia. No entanto, muitos de nós não têm essa possibilidade e, nesse caso, há uma maior garantia de produção sustentável e saudável ao comprar itens com o certificado biológico.