Início » 20% dos resíduos perigosos em Portugal podem ficar sem destino
O Ministério do Ambiente e da Ação Climática pretende alterar de forma radical o atual sistema nacional de tratamento dos resíduos perigosos, através da não prorrogação das licenças e da respetiva exclusividade dos Centros Integrados de Recuperação, Valorização e Eliminação de Resíduos Perigosos (CIRVER).
Os CIRVER são unidades de tratamento de resíduos perigosos localizadas no concelho da Chamusca e que resultaram de um concurso nacional para o tratamento destes resíduos. Com a sua entrada em funcionamento, a par de outras unidades já existentes, o país ficou dotado de um sistema moderno e eficaz para o tratamento de praticamente todas as tipologias de resíduos perigosos.
No entanto, apesar desta realidade, o Governo argumenta que é importante abrir este mercado a outras empresas de tratamento de resíduos perigosos, de forma a garantir a autossuficiência do País nesta área.
A APA, em parecer sobre esta proposta de alteração, conclui que, se os CIRVER ficarem sem a exclusividade, várias das unidades de tratamento que os constituem poderão deixar de funcionar, uma vez que esse funcionamento só decorria da obrigação que constava das atuais licenças dos CIRVER.
Com a não prorrogação dessas licenças, os CIRVER deixam, assim, de ser obrigados a tratar os resíduos que são economicamente menos interessantes, o que, segundo a APA, corresponde a cerca de 20% dos resíduos perigosos que são tratados nestas unidades.
Deste modo, a confirmar-se a intenção do Governo de não prorrogar as licenças dos CIRVER, Portugal corre o sério risco de ter de voltar à exportação de resíduos perigosos, situação que praticamente tinha desaparecido com a entrada em funcionamento destas unidades.
Ao concentrarem em duas unidades o tratamento da grande maioria dos resíduos perigosos em Portugal, os CIRVER vieram facilitar o trabalho de fiscalização que deve ser feito pelas autoridades ambientais.
Com a possível proliferação de várias unidades de tratamento de resíduos perigosos pelo País, decorrente da alteração proposta pelo Governo, vão aumentar significativamente as dificuldades das autoridades ambientais na fiscalização deste setor.
Convém lembrar que a proposta do Governo é que parte dos resíduos perigosos sejam depositados em aterros para resíduos não perigosos, quando se conhecem os problemas ambientais que têm surgido em alguns desses aterros, para não falar no escândalo que foi a colocação ilegal, durante mais de uma década, de amianto em células de aterros que também recebiam resíduos biodegradáveis.
O Governo pretende não prorrogar as licenças dos CIRVER, as quais terminam a 8 de novembro deste ano, mas não explica como é que os CIRVER vão trabalhar depois dessa data.
Com efeito, as atuais licenças dos CIRVER estão enquadradas na legislação que criou a própria figura dos CIRVER, pelo que a não prorrogação dessas licenças pode vir a criar um vazio legal sobre o licenciamento destas unidades, uma vez que os CIRVER, ao perderem as atuais licenças, poderão ficar sem base legal para poderem continuar a trabalhar depois de 8 de novembro.
Uma alternativa seria os CIRVER pedirem agora novas licenças fora o âmbito do regime dos CIRVER, mas isso levaria muito tempo e seguramente essa situação não estaria resolvida antes da data de caducidade das atuais licenças, levantando-se legitimamente a dúvida sobre a possibilidade de Portugal, a partir de 8 de novembro, de poder vir a ficar sem tratamento para a esmagadora maioria dos seus resíduos perigosos.
A ZERO está preocupada pela evidente falta de transparência que tem caracterizado este processo.
Em primeiro lugar, pelo facto de estas alterações serem justificadas pela necessidade de garantir a autossuficiência do tratamento dos resíduos perigosos, quando é a própria APA que reconhece o elevado risco que o mesmo acarreta de redução da autossuficiência.
Em segundo lugar, porque os documentos que sustêm esta decisão falam que não houve concordância entre as diversas entidades que compõem o Observatório dos CIRVER (órgão de controlo do funcionamento destas unidades) quanto à prorrogação ou não das licenças dos CIRVER, o que não corresponde à verdade, uma vez que todas as entidades que se manifestaram, o fizeram a favor da prorrogação dessas licenças, nomeadamente a Câmara Municipal da Chamusca, a Associação Nacional de Municípios, a CCDR-LVT, a Administração Regional de Saúde-LVT e a Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente. De referir que também as associações ambientalistas ZERO e Quercus já tomaram posição a favor da prorrogação das licenças.
Em terceiro lugar, porque o argumento utilizado pelo Governo para justificar esta medida também refere questões económicas, nomeadamente a redução do custos de tratamento, o que não corresponde de todo à verdade, basta ver que o tratamento de resíduos perigosos em aterros de resíduos não perigosos necessita da aplicação de cerca do triplo da quantidade de reagentes do que quando se utiliza um aterro construído especificamente para resíduos perigosos.
Quanto a este aspeto, convém lembrar que a legislação dos CIRVER permitia à APA a fixação de preços máximos para o tratamento dos resíduos perigosos, ferramenta a que aquela entidade nunca recorreu, o que prova que a questão do custo do tratamento é uma falsa questão.
Finalmente, é argumentado que a não prorrogação das licenças dos CIRVER vai abrir o espaço à inovação tecnológica, mas, na proposta de despacho, o Governo só dá como exemplo a colocação de resíduos perigosos em aterros de resíduos não perigosos, o que não é propriamente uma grande inovação tecnológica.
Para além disso, a legislação atual permite à APA obrigar os CIRVER a inovações tecnológicas, pelo que o atual sistema já dá uma resposta a essa questão, não sendo essa uma razão suficiente para a sua alteração.
A proposta de Despacho do Secretário de Estado do Ambiente (SEAMB) que aponta para a não prorrogação das licenças dos CIRVER refere que “(…) encontra-se em curso a revisão do regime jurídico do licenciamento da instalação e da exploração dos centros integrados de recuperação, valorização e eliminação de resíduos perigosos.”
Ora, isto não faz qualquer sentido, uma vez que o que vai acontecer é o fim do regime jurídico dos CIRVER e não a sua revisão, tal como a APA já confirmou à ZERO.
Ou seja, a proposta de Despacho do SEAMB, para além de ter sido emitida muito depois do prazo estabelecido na lei, contém informações que não são verdadeiras, o que só pode trazer mais complicações a todo este processo.
Na sequência do acima exposto e também de uma carta já enviada em abril ao SEAMB sobre este assunto, a ZERO solicitou o agendamento de uma reunião com o Senhor Secretário de Estado do Ambiente, no sentido de promover um melhor esclarecimento de vários equívocos que estão na base da decisão de não prorrogação das licenças dos CIRVER.
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