Início » Centrais solares ocuparão dez mil hectares até 2030 – ZERO quer maiores cuidados e planeamento
ZERO analisou impactes de nove grandes centrais solares que estiveram em consulta pública no primeiro trimestre de 2021.
A ZERO fez as contas e concluiu que as nove centrais solares fotovoltaicas que estiveram em consulta pública no primeiro trimestre do ano, para a instalação dos painéis fotovoltaicos e estruturas de apoio associadas a uma potência de 2,4 GW, excluindo as linhas elétricas aéreas de ligação à Rede Nacional de Transporte de Eletricidade, vão exigir uma área vedada para a implantação superior a 3 500 hectares (ha). Esta área, aparentemente pequena tendo em consideração o território nacional, é no entanto um alerta para o presente e para o futuro, considerando que há um objetivo de atingir mais de 9 GW de potência solar até 2030, aproximadamente 7 GW em solar centralizado e 2 GW em solar descentralizado Note-se que no final de 2020 existiam cerca de 600 MW de potência solar centralizada instalada. As estimativas para 2030 serão provavelmente mais elevadas dado não se considerar neste valor as necessidades extraordinárias relacionadas com a produção de hidrogénio verde, segundo os objetivos do governo. Neste contexto, o valor poderá chegar perto ou superar os 10 mil hectares, uma área equivalente ao concelho de Lisboa. Considerando que a opção pode recair na concentração dos projetos em determinadas regiões e em áreas sensíveis, o resultado final pode ser desastroso.
Dos nove projetos [1], com uma potência instalada na ordem dos 2,4 GW e com uma produção anual prevista de 3 855 GWh, apenas um tem a intenção de instalar a central solar fotovoltaica numa área concessionada para exploração de recursos geológicos, junto a uma área de pedreiras. Os restantes projetaram a instalação incluindo por vezes áreas de Reserva Ecológica Nacional, assim como em áreas florestais submetidas a regime florestal, nomeadamente Perímetros florestais como é o caso da Central Solar Fotovoltaica de Lupina ou Zonas de Intervenção Florestal, no caso de Central Solar Fotovoltaica da Falagueira. Existem outras que afetam áreas classificadas como florestais, mas sem estarem abrangidas por um regime de gestão florestal. Assim, entre áreas com montado e sobreiros dispersos, outras folhosas, pinheiro-bravo e pinheiro-manso e eucaliptos, estão em causa mais de 2 200 ha de área florestal que serão afetadas com a instalação de centrais fotovoltaicas, ou seja, 63% da área a intervencionar.
Numa apreciação da ZERO recorrendo às cores de um semáforo (presente em anexo) fundamentada nos pareceres que foram entregues pela associação aquando da recente consulta pública, três projetos pela sua dimensão e pelo tipo de área afetada ou extensão das linhas de muito alta tensão, recebem cor vermelha; cinco têm alguns aspetos que era importante serem fortemente acautelados e recebem cor laranja e apenas um é um exemplo a seguir e tem sinal verde.
A ZERO olha com muita apreensão para esta nova corrida à instalação de parques solares fotovoltaicos, alguns de grande dimensão, em que a seleção dos locais recai em grande parte sobre áreas florestais, desde logo porque, com a destruição das florestas, os benefícios ambientais que decorrem da instalação podem não ser superiores aos da manutenção da área florestal.
Para além disso, não podemos esquecer que esta artificialização, como que “alcatifando” o território resulta numa enorme alteração da paisagem e artificialização de áreas rurais, com inevitáveis impactes negativos para o ambiente e para as populações que aí residem. A própria atratividade dos territórios é posta em causa, o que pode trazer perdas para o potencial turístico e para a valorização do património natural da região. Atendendo ao peso que esta indústria tem na economia do país e à importância que a mesma tem nos territórios rurais, este é um fator a integrar na análise.
O concelho de Santiago do Cacém é hoje muito procurado para a instalação de centrais solares, sendo que os projetos atualmente previstos representam uma ocupação do território concelhio superior a 1,5% e para uma das freguesias, onde existe a intenção de instalar três centrais que ocuparão cerca de 6% da freguesia, uma delas com uma área contínua vedada com 1 262 ha e com uma vedação que chega a atingir os 30 km de extensão.
Os impactes na avifauna
Embora não existam estudos na Europa, os que foram realizados nos Estados Unidos da América com base em dados de relatórios relativos a várias tipologias de centrais solares fotovoltaicas, apontam para a existência de impactes significativos sobre a avifauna. Embora exista um conjunto de fatores que influenciam a variabilidade nas espécies a nível regional e a localização das centrais, um dos estudos aponta para uma mortalidade na ordem dos 0,5 e 10,24 aves/MW/ano [2], valor que foi estimado em cerca de 2,49 aves/megawatt/ano mortas por colisão [3]. Este é um valor inferior às 3-4 aves que em média morrem por colisão nas linhas elétricas [4], mas ainda assim muito significativo e que deve traduzir-se no evitar de parques solares de grandes dimensões quando em presença de espécies com estatuto de conservação desfavorável. Para a ZERO exige-se a aplicação do princípio da precaução evitando a instalação de parques fotovoltaicos de grande dimensão em áreas atravessadas por corredores primários e evidentemente em ZPE.
Mais 100 km de linhas aéreas para transporte de eletricidade
Para a implementação destes nove projetos, será necessário proceder à instalação de mais 100 quilómetros de linhas aéreas para transporte de energia e ligação à Rede Nacional de Transporte de Eletricidade, das quais 48,7 km são Linhas de Muito Alta Tensão (LMAT). A instalação de linhas elétricas trará consigo um conjunto de impactes significativos para a avifauna com mortalidade decorrente de colisão com os condutores aéreos e a eletrocussão em apoios ou postes elétricos. Estudos realizados em território nacional sobre o impacte das linhas de Média e Alta Tensão na avifauna [4], apontam para que aproximadamente 25% das espécies afetadas apresentam um estatuto de conservação desfavorável. Há assim necessidade de assegurar uma maior proximidade em relação a linhas existentes, como a existência de medidas de mitigação que podem incluir linhas enterradas nalgumas áreas mais sensíveis.
São também de referir os impactes na paisagem devido à proliferação de um emaranhado de estruturas e linhas, assim como resultado da destruição do coberto vegetal decorrentes do cumprimento da legislação em vigor, a qual exige o corte ou decote das árvores para garantir a distância mínima de segurança assim como a gestão de combustíveis no corredor de segurança da linha. Também não são de desprezar as condicionantes na utilização do solo decorrentes da instalação das linhas aéreas, que em espaço rural vão limitar as atividades económicas e de usufruto das populações aí residentes.
Mega centrais que artificializem solos com importantes valências ambientais não podem ser a solução de futuro!
Numa altura em que se avolumam as intenções de investimento no solar fotovoltaico, uma situação que se considera positiva para que o país alcance a neutralidade climática em 2050, é fundamental prevenir impactes e conflitos, como os que tiveram lugar no passado com a expansão da energia eólica em zonas sensíveis, pelo que a ZERO advoga:
● Devem ser excluídos os projetos de parques fotovoltaicos em áreas florestais ou com solos agrícolas, sempre que os custos ambientais superem os benefícios (por exemplo, se o balanço de carbono não for suficientemente positivo ou se existir uma significativa destruição de valores naturais protegidos);
● Devem ser excluídos os projetos de parques fotovoltaicos em Áreas Protegidas, áreas de Rede Natura 2000 e Reserva Agrícola Nacional;
● Devem ser efetuados estudos urgentes sobre o impacte das centrais na fauna, em particular sobre a avifauna, por forma a encontrar soluções de mitigação ou orientações limitantes da escolha dos locais de instalação;
● As centrais que se instalem em áreas degradadas (pedreiras inativas, minas abandonadas, zonas industriais, áreas com solos contaminados, áreas urbanas desocupadas, áreas com solos degradados situadas em zonas em risco de desertificação), de preferência junto a centros urbanos, deverão ser alvo de incentivos;
● A atribuição de potência solar, em geral, e os chamados leilões solares, em particular, devem privilegiar áreas já artificializadas, que constituindo 5% do território são mais do que suficientes para suprir as necessidades energéticas do país, como barragens, canais de rega ou grandes infraestruturas de transporte, entre outras;
● Seria de extrema utilidade que o Ministério do Ambiente elaborasse uma carta que delimitasse com o máximo detalhe possível as áreas do território com aptidão para receber instalações fotovoltaicas de grande dimensão e que essas áreas tivessem em conta o planeamento definido para a rede nacional de transporte de energia elétrica, de modo a racionalizar a área ocupada por linhas aéreas, ou seja é necessária uma carta de ocupação do território para o solar;
● Para todas as instalações fotovoltaicas de grande dimensão deve existir um plano de recuperação de solos que incorpore o recurso a resíduos agrícolas e florestais e o uso de rebanhos nas operações de manutenção;
● O Governo Português deve criar mecanismos para estimular a produção de energia elétrica renovável no setor residencial, industrial e serviços, já que o DL de promoção do autoconsumo e comunidades de energia renovável ficou muito aquém das expectativas;
● Todos os edifícios públicos, incluindo escolas e pavilhões desportivos, deverão estar equipados até 2030 com sistemas solares fotovoltaicos;
● A APA deve publicar um guia de boas práticas relativo à instalação, manutenção e descomissionamento de grandes parques fotovoltaicos.
[2] Walston, Leroy & Szoldatits, Katherine & Lagory, Kirk & Smith, Karen & Meyers, Stephanie. (2016). A preliminary assessment of avian mortality at utility-scale solar energy facilities in the United States. Renewable Energy. 92. 405-414. 10.1016/j.renene.2016.02.041. (https://www.researchgate.net/figure/Utility-scale- solar-facilities-with-available-avian-fatality-data-and-major-wind- projects_fig1_295399068)
[3] Kosciuch K, Riser-Espinoza D, Gerringer M, Erickson W. A summary of bird mortality at photovoltaic utility scale solar facilities in the Southwestern U.S. PLoS One. 2020;15(4):e0232034. Published 2020 Apr 24. doi:10.1371/journal.pone.0232034 (https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7182256/)
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