Início » No projeto da mina do Romano, o lobo-ibérico será descartável
Termina hoje o processo de consulta pública à modificação do projeto “Concessão de Exploração de Depósitos Minerais de Lítio e Minerais – Romano”, no concelho de Montalegre, com uma área a intervencionar de entre 140 a 156 hectares (ha). Neste momento, o foco principal é a localização do Complexo de Anexos Mineiros (CAM), referente à unidade de hidrometalúrgica que teve parecer desfavorável por parte da Comissão de Avaliação (CA).
Este processo de consulta pública vem no seguimento da aplicação do procedimento previsto no n.º 2 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º151-B/2021, de 31 de outubro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º11/2023, de 10 de fevereiro, segundo o qual, e face ao parecer desfavorável da CA a parte do projeto, a autoridade de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) deve ponderar, em articulação com o proponente, a eventual necessidade de modificação do projeto para evitar ou reduzir efeitos significativos no ambiente, assim como a necessidade de prever medidas adicionais de minimização ou compensação ambiental.
Nesta nova consulta pública, que não envolve o projeto de exploração em si, mas o Complexo de Anexos Mineiros (CAM), o promotor analisou três cenários: Nova localização para a CAM; Manutenção da Alternativa A, caso se verifique uma alteração de Plano Diretor Municipal (PDM), e nos usos previstos na Planta de Ordenamento do mesmo; Manutenção da Alternativa B, através da aplicação de medidas de minimização/compensatórias eficazes que compatibilizem esta infraestrutura com a presença da população lupina da região do Barroso.
Segundo o promotor, qualquer análise que é apresentada de relocalização dentro da área de concessão esbarra em condicionantes de ordenamento do território. Qualquer deslocalização para uma maior distância não é tida em consideração, dado que não pretendem abandonar o conceito de “ilha” com o qual o transporte de materiais por telas é inviabilizado, pelo que a Alternativa A cai por terra e o promotor refugia-se na minimização e compensação dos impactes ambientais resultantes da implementação do projeto.
A proposta do promotor recai na manutenção da Alternativa B, a qual foi anteriormente alvo de críticas por parte da CA, por perturbação da área vital da alcateia de lobo-ibérico do Leiranco.
Não obstante todas as críticas da ZERO apresentadas na primeira consulta pública – que decorreu até 10 de maio 2022 e que continuam a ser válidas hoje –, é com agrado que se verifica que a Alternativa A para a instalação da hidrometalúrgica, cujos impactes sobre a população de Morgade eram significativos, é inviável segundo os instrumentos de ordenamento do território. Contudo, continua a insistência numa alternativa em que os valores naturais, são relegados para um segundo plano. Neste caso em concreto, uma espécie emblemática, o lobo-ibérico, de conservação prioritária, segundo a Diretiva-Habitats, que é estritamente protegida (Lei n.º 90/88 de 13 de agosto e Decreto-Lei 54/2016 de 2 de agosto) e cujo estatuto de conservação é desfavorável (‘Em perigo’ – EN). Mesmo legalmente protegido, a sua sobrevivência está fortemente ameaçada, nomeadamente pela destruição e fragmentação do habitat, causados pela atividade humana.
Nesta modificação do projeto, em que prevalece a Alternativa B de localização do CAM, é incluído um projeto de Proteção dos Sistemas Ecológicos, que procura criar condições para que o mesmo possa coabitar num território com uma mina e com população perto, numa lógica de compensação ao impacte negativo, direto, permanente, irreversível sobre esta espécie. A solução de compatibilização passa por um conjunto de medidas de compensação que, segundo a ZERO, em muitos pontos não passam de promessas. Pretende-se assegurar a conservação dos ecossistemas de montanha, nomeadamente com a reflorestação de áreas ardidas e de matos com espécies autóctones, recuperar habitats que favorecem a fixação do lobo na serra, e criar condições para o desenvolvimento das espécies cinegéticas de forma a equilibrar a cadeia alimentar do lobo, criando condições para o mesmo poder coabitar num território com uma mina e com população perto. Acrescem os trabalhos de estudo e monitorização, que quase sagradamente surgem sempre como medida de minimização nos processos de Avaliação de Impacte Ambiental, e raramente resultam em algo de concreto, assim como ações de sensibilização e de gestão que promovam o valor do lobo.
Não podemos afirmar que o projeto de compensação não terá as suas virtudes e benefícios para a espécie, mas este será sempre no longo prazo, percorrendo um caminho ao longo de várias décadas que ultrapassa em muito o aparente tempo de vida do projeto mineiro, pelo que a ZERO tem muitas dúvidas que verdadeiramente compensem no curto prazo os impactes sobre a espécie.
Quando se fala em impactes sobre a território, as pessoas e a biodiversidade, estes vão-se fazer sentir no imediato, de forma muitas vezes irreversível e não podem de forma alguma cingir-se à Mina do Romano. Basta olhar para as imediações de Covas do Barroso, a uns meros 14 km de distância da Mina do Romano, onde vão surgindo pedidos para concessão de direitos para prospeção de pesquisa, e pedidos de alargamento de áreas de exploração mineira, não se circunscrevendo à ampliação da Mina do Barroso, recentemente alvo de decisão favorável condicionada. Estes prometem com toda a certeza ser um fator acrescido de pressão sobre a paisagem e os valores naturais em presença e utilização pouco sustentável do território. Numa análise dos projetos caso-a-caso, o Lobo-ibérico, é uma das espécies que será forçada a adaptar-se.
A ZERO reconhece que neste momento, no combate às alterações climáticas que já hoje afeta milhões de pessoas, inclusive na Europa, a eletrificação da sociedade tem na tecnologia com base no lítio um importante aliado na transição energética. Contudo, não deixa de ser verdade que a mesma não pode justificar uma extração de recursos minerais a qualquer custo, sem que sejam devidamente acautelados os impactes sociais, económicos e ambientais.
Lamentavelmente a Avaliação Ambiental Estratégica, realizada em 2021, deixou de fora este e outros projetos para exploração mineira de lítio. Certamente estas questões de conflito com as populações e valores naturais poderiam ter sido devidamente acauteladas. As avaliações caso-a-caso têm enormes fragilidades no que respeita a uma análise global que tenha em consideração toda uma região, e os impactes cumuláveis resultantes sobre cada um dos domínios avaliados, em especial sobre os valores naturais que não podem de forma alguma ser circunscritos aos limites das áreas classificadas.
É preocupante pensar que, a curto e médio prazos, poderemos ver circular nas estradas europeias carros cujas baterias estão associadas a impactes ambientais muito significativos, que contribuíram para o incremento da pressão sobre habitats e espécies com estado de conservação desfavorável, para além de impactes sobre as populações que residem nos territórios. Pode ser em pequeno número, mas são cidadãos de pleno direito e exigem todo o respeito.
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