Início » O que fazemos » Pareceres » Plano de Reestruturação do Setor das Pescas na Região Autónoma dos Açores (2025–2030)
No papel de organização não-governamental de ambiente comprometida com a conservação do oceano e com a promoção da sustentabilidade dos recursos naturais, a ZERO está igualmente consciente da precariedade estrutural que caracteriza o setor das pescas e da sua relevância social, cultural e económica para a Região Autónoma dos Açores. Assim, congratulamos o Governo Regional pela apresentação do Plano de Reestruturação do Setor das Pescas 2025–2030, tratando-se de um instrumento de extrema importância para apoiar a adaptação do setor a uma nova realidade ambiental e económica, através de uma estratégia que se pretende moderna, abrangente e capaz de responder aos múltiplos desafios que se colocam.
Valoriza-se o facto de o plano assumir de forma frontal os constrangimentos ecológicos, económicos e sociais que hoje afetam o setor, e que o faça propondo um quadro estratégico ambicioso, ancorado em princípios de sustentabilidade e numa abordagem de gestão baseada no ecossistema.
Importa, contudo, sublinhar que a eficácia desta reestruturação dependerá em larga medida do grau de compromisso político com a implementação das medidas mais estruturantes, da definição de metas concretas e vinculativas, e da capacidade de colmatar as lacunas ainda existentes.
de fiscalização historicamente limitados. Estes mecanismos revelam-se insuficientes para enfrentar os desafios atuais, designadamente a expansão das Áreas Marinhas Protegidas e a adaptação do setor a novos regimes de gestão. Garantir um controlo eficaz é indispensável para assegurar o cumprimento rigoroso das normas, orientar as incertezas do setor e combater a pesca ilegal, não declarada e não regulamentada, promovendo a sustentabilidade e a confiança na gestão dos recursos marinhos.
Apesar dos seus méritos, o plano contém ambiguidades e potenciais fragilidades que se revelam preocupantes:
Ambiguidade na redução da frota: A medida que aborda a cessação definitiva de atividades para ajustar o esforço de pesca aos níveis sustentáveis dos recursos, é central para assegurar a sustentabilidade a longo prazo. Contudo, a sua redação é excessivamente vaga, limitando-se a “avaliar a possibilidade de implementar” em vez de assumir compromissos claros e vinculativos com metas concretas e calendarizadas para a redução da capacidade de pesca. Na ausência de uma diminuição efetiva da pressão sobre os stocks vulneráveis, o risco de sobreexploração mantém se, comprometendo a recuperação dos ecossistemas e a viabilidade futura do setor.
Risco da modernização tecnológica da frota: A medida que promove a modernização da frota com o objetivo de melhorar a eficiência energética, e assim reduzir as emissões de CO₂ associadas à atividade pesqueira, traduz uma meta ambiental bastante relevante que acarreta, porém, alguns riscos. O aumento da autonomia, da velocidade e da capacidade operacional das embarcações pode resultar num acréscimo do esforço de pesca que, sem mecanismos de controlo eficazes, tende a intensificar a pressão sobre os recursos marinhos e a comprometer os objetivos de sustentabilidade. Torna-se, por isso, imperativo que o plano condicione de forma explícita e vinculativa os apoios à modernização a uma redução paralela, comprovada e monitorizável do esforço de pesca global — uma ligação que, na formulação atual, não está suficientemente assegurada.
Carência de medidas concretas sobre frotas não regionais: O plano reconhece o impacto das frotas não regionais na ZEE dos Açores como uma ameaça relevante, mas não define qualquer medida específica além do reforço genérico da fiscalização. Esta omissão é particularmente sensível, pois coloca em causa a coerência e a equidade do próprio plano. A ausência de ações dirigidas a estas frotas pode gerar a perceção de que o esforço de adaptação recai de forma desproporcionada sobre o setor regional, enquanto operadores externos continuam a explorar os mesmos recursos com menor controlo e sem compromissos equivalentes. Esta assimetria não só fragiliza os objetivos de conservação e sustentabilidade, como compromete a aceitação social do plano. É, por isso, essencial que o impacto das frotas não regionais seja alvo de atenção reforçada, com medidas específicas que assegurem a equidade na distribuição de responsabilidades e o cumprimento efetivo das regras por todos os operadores que atuam na região.
Falta de clareza na definição de infrações: A medida que prevê a suspensão de apoios públicos em caso de “infrações reiteradas” é inegavelmente importante, mas revela-se pouco clara quanto à sua interpretação. É fundamental definir com precisão o número de infrações, a sua gravidade e o período em que devem ocorrer, uma vez que a indefinição atual dificulta a aplicação eficaz e justa da sanção. O plano deve estabelecer critérios objetivos e procedimentos claros para garantir transparência e credibilidade no processo.
Abordagem tímida às capturas acessórias não intencionais (byctach): O bycatch é um problema altamente representativo em Portugal, constituindo uma ineficiência estrutural da atividade pesqueira com impactos ecológicos severos sobre aves marinhas, cetáceos, tartarugas, tubarões e outras espécies vulneráveis. Além das implicações que traz em matéria de conservação, compromete igualmente a eficiência e a credibilidade do setor, colocando em causa a sua viabilidade económica e social a médio prazo. Num plano que visa precisamente apoiar a transição do setor para modelos mais sustentáveis, seria expectável uma abordagem mais assertiva ao problema. No entanto, este limita-se à recolha e análise de dados, protelando a definição de medidas para um momento posterior. O plano deveria prever desde já a obrigatoriedade de adoção de tecnologias comprovadas para reduzir as capturas acessórias de espécies sensíveis e definir um roteiro claro para a implementação de sistemas de monitorização eletrónica remota (Vessel Monitoring System – VMS), fundamentais para assegurar o cumprimento da obrigação de descarga e reforçar a confiança no regime de gestão.
Garantias insuficientes para uma transição justa: Do ponto de vista do financiamento, o plano aponta diversas fontes possíveis (Orçamento da Região Autónoma dos Açores, MAR 2030, PRR, Fundo Ambiental, entre outras), mas não apresenta orçamentação detalhada por medida ou eixo de ação, dificultando a aferição da viabilidade da execução. Acresce que o documento não indica valores concretos, número de operadores afetados nem critérios de elegibilidade, o que impede uma avaliação realista da suficiência desta medida.
A ZERO reconhece que o Plano de Reestruturação do Setor das Pescas da Região Autónoma dos Açores para 2025– 2030 é um documento estratégico de elevada qualidade, com o potencial de posicionar os Açores como referência internacional em sustentabilidade pesqueira. No entanto, identifica fragilidades significativas, nomeadamente a ausência de compromissos claros, metas vinculativas e um detalhamento insuficiente dos mecanismos de financiamento e fiscalização, fatores que poderão comprometer a eficácia do plano.
Neste sentido, recomendamos:
A ZERO entende que a integração efetiva das organizações não governamentais nas estruturas de cogestão e no acompanhamento dos planos deve tornar-se uma prática regular, contribuindo para maior transparência, representatividade, rigor e envolvimento da sociedade civil. Manifesta, por isso, a sua total disponibilidade para colaborar com as entidades regionais na concretização das medidas previstas e no acompanhamento da execução do plano, contribuindo para uma transição justa, eficaz e ambientalmente responsável do setor das pescas nos Açores.
Cookie | Duração | Descrição |
---|---|---|
cookielawinfo-checkbox-analytics | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Analytics". |
cookielawinfo-checkbox-functional | 11 months | The cookie is set by GDPR cookie consent to record the user consent for the cookies in the category "Functional". |
cookielawinfo-checkbox-necessary | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookies is used to store the user consent for the cookies in the category "Necessary". |
cookielawinfo-checkbox-others | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Other. |
cookielawinfo-checkbox-performance | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Performance". |
viewed_cookie_policy | 11 months | The cookie is set by the GDPR Cookie Consent plugin and is used to store whether or not user has consented to the use of cookies. It does not store any personal data. |