Início » Portugal deve encerrar faseadamente a rede de gás natural fóssil
Terminou, ontem, dia 20 de junho de 2025, a consulta pública do Plano Decenal Indicativo de Desenvolvimento e Investimento na Rede Nacional de Transporte, Infraestruturas de Armazenamento e Terminais de GNL (Gás Natural Liquefeito) – PDIRG 2025 –, no âmbito da qual a ZERO apresentou um parecer, expressando a sua firme oposição à estratégia de investimentos proposta. O PDIRG 2025, na forma apresentada, não está alinhado com a trajetória nacional e europeia de descarbonização, não respeita os princípios de suficiência e eficiência energética, e arrisca perpetuar infraestruturas de gás fóssil obsoletas, comprometendo recursos que deveriam ser direcionados para soluções energéticas verdadeiramente sustentáveis.
A proposta do PDIRG 2025 assenta fortemente em projetos de blending (mistura) de hidrogénio com gás fóssil (gás natural), prevendo investimentos superiores a 111 milhões de euros para adaptar a rede de transporte de gás (RNTG) e o armazenamento subterrâneo (AS) a misturas de até 10% de hidrogénio em volume. Esta opção, que procura manter a atual rede de gás como peça central do sistema energético, não só carece de racionalidade económica e técnica, como é explicitamente desaconselhada pelo novo quadro legislativo europeu.
Conforme a própria ERSE (Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos) refere, o Regulamento (UE) 2024/1789 estabelece que o blending deve ser considerado uma solução de último recurso, fixando o limite de 2% em volume para evitar distorções de mercado e riscos de qualidade no fornecimento de gás. Assim, não existe base legal, técnica ou estratégica para promover investimentos pesados numa tecnologia de transição. Insistir em desperdiçar energia renovável e investimentos que visem a injeção de quantidades significativas de hidrogénio verde na Rede é apostar num modelo de curto prazo, tecnologicamente ultrapassado e com elevado risco de geração de ativos sem retorno.
A ZERO reafirma a sua posição de que o modelo mais eficiente e sustentável para o aproveitamento dos gases renováveis — seja o hidrogénio verde, seja o biometano — passa pela produção descentralizada, próxima dos centros de consumo. Este princípio, amplamente reconhecido no debate técnico nacional e internacional, maximiza a eficiência energética, minimiza perdas no transporte, reduz custos de infraestrutura e evita investimentos desnecessários em redes de grande escala.
A proposta do PDIRG 2025, ao projetar a manutenção de redes de transporte de gases renováveis extensas e investimentos avultados em infraestruturas centralizadas, ignora esta lógica de proximidade. No caso do hidrogénio, este desfasamento é particularmente grave, tendo em conta que o hidrogénio deverá ser reservado, sobretudo, para setores de difícil eletrificação, como o transporte marítimo, a aviação e parte da indústria pesada, e não para consumo residencial ou generalista através da rede de gás existente. A utilização generalizada de hidrogénio e biometano em setores que podem ser diretamente eletrificados representa uma opção ineficiente e com impactos significativos no território. Esta escolha implica uma maior necessidade de produção de eletricidade renovável — nomeadamente a partir de sistemas fotovoltaicos, eólicos e hídricos — para compensar as perdas energéticas associadas à conversão e uso desses vetores. No caso do biometano, a aposta excessiva neste combustível pode ainda perpetuar um setor pecuário sobredimensionado, contrariando os objetivos de sustentabilidade ambiental e de uso racional dos solos.
A ZERO defende a necessidade urgente de planear o descomissionamento faseado da Rede Nacional de Transporte de Gás (RNTG), com um horizonte de encerramento total a partir de meados da década de 2040. Com a eletrificação progressiva dos consumos e a forte redução já observada no consumo de gás na Europa e em Portugal, não existe justificação económica, ambiental ou estratégica para continuar a expandir ou prolongar o ciclo de vida de grandes infraestruturas de gás fóssil.
É fundamental iniciar desde já a avaliação do potencial de reconversão do espaço canal atualmente reservado ao transporte de gás para funções alinhadas com os objetivos da neutralidade carbónica e da economia circular. Uma das utilizações estratégicas será a criação de redes para o transporte de CO₂ de origem biogénica, indispensável para a produção de combustíveis sintéticos sustentáveis. A partir de 2040, apenas o carbono capturado de fontes não fósseis poderá ser utilizado neste tipo de combustíveis, em conformidade com os regulamentos europeus, o que reforça a necessidade de infraestruturas adequadas para assegurar essa cadeia de fornecimento. Esta reconversão permitirá dar um novo uso racional e sustentável às infraestruturas existentes, contribuindo para a descarbonização de setores difíceis de eletrificar, como a aviação e o transporte marítimo internacionais, bem como para processos industriais que requerem carbono renovável.
A proposta de expansão da capacidade de transbordo (transhipment) de GNL (Gás Natural Liquefeito) no Terminal de Sines, através da construção de uma quarta baía de enchimento de cisternas, constitui outro exemplo de investimento desfasado dos objetivos climáticos. Com o consumo de gás natural em forte retração, e com o crescimento acelerado das renováveis e da eletrificação, não se compreende o reforço de infraestruturas associadas à importação de gás fóssil. Trata-se de um risco elevado de criação de mais investimentos sem retorno, contrariando o princípio de eficiência na utilização de fundos públicos e privados.
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