Início » Processo legislativo com vista à definição de Moratória sobre a mineração em mar profundo deve ser retomado
8 de junho – Dia Mundial do Oceano
A pequenos passos de alcançarmos 2030, continua bastante por fazer. Na sua adesão à Agenda 2030, Portugal assumiu compromissos claros para a conservação e uso sustentável do oceano, mares e recursos marinhos, patentes no Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 14 – proteger a vida marinha. No entanto, a Década do Oceano, que prometia uma abordagem mais ambiciosa para a proteção e preservação do ambiente marinho, corre o risco de vir a revelar-se apenas um título bonito que nos distrai de desafios que tendem a acumular-se.
Atualmente, pouco mais de 8% do oceano se encontra protegido em Portugal, muito aquém das metas a que Portugal se propôs – inicialmente 30% até 2030 e, anunciado em outubro do ano passado pelo anterior Governo, a antecipação de alcançar os 30% até 2026. Ainda mais preocupante é o facto de mesmo os 8% não disporem de mecanismos que permitam gerir e monitorizar eficazmente as suas áreas, abrindo espaço para atividades que comprometem a integridade dos ecossistemas. Olhando para estas lacunas de conhecimento e para o facto de mais de 80% do oceano ser ainda desconhecido, parece-nos claro que existem decisões urgentes a serem tomadas e medidas aplicadas na direção certa, não caindo em retrocessos.
Portugal continua a falhar gritantemente na sua intenção de passar de palavras a atos e a ZERO realça agora para a necessidade de maior foco em temas que ameaçam os objetivos de proteção do oceano, em particular em relação à mineração em mar profundo (deep sea mining) (1).
Em outubro de 2023, a Assembleia da República aprovou o Projeto de Lei n.º 230/XV/1, que impunha uma moratória à mineração em mar profundo nas águas portuguesas até 2050. Porém, quando o texto estava programado para ser discutido em detalhe na comissão parlamentar correspondente, o governo caiu, o que levou à interrupção da legislatura e, consequentemente, a iniciativa caducou, não entrando em vigor.
Também em 2023, Portugal manifestou na Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (AIFM) (2) – em inglês, International Seabed Authority (ISA) – a necessidade de implementar uma “pausa precaucionária” no avanço desta atividade em áreas fora da jurisdição nacional, dando destaque à ausência de regulamentação e conhecimento científico insuficiente. De forma pioneira, em abril do mesmo ano, a Assembleia Legislativa dos Açores, região portuguesa alvo de interesse desta indústria, aprovou por unanimidade uma resolução que pedia uma moratória à atividade até 2050.
Governo deve posicionar-se adequadamente e Assembleia da República deve retomar processo legislativo
O atual Governo português ainda não se posicionou clara e definitivamente sobre o tema, nem declarou uma moratória para toda a sua Zona Económica Exclusiva (até às 200 milhas náuticas), o que salvaguarda uma parte significativa do território marítimo europeu. Além disso, uma vez que Portugal se encontra em processo de extensão da plataforma continental, até haver veredito, essa proteção estender-se-ia até às 350 milhas náuticas.
Considerando a volatilidade da atual conjuntura política, é imprescindível não só que o novo Governo não negligencie este assunto prioritário, mas também que a Assembleia da República retome a iniciativa legislativa não concluída em 2023, para que a moratória assuma a forma de Lei, com carácter vinculativo pelo menos até 2050, e assim fique mais “blindada” face às dinâmicas dos futuros ciclos políticos.
A ZERO exorta igualmente todos os Estados-Membros da EU a implementarem uma moratória ou pausa à exploração mineira nas águas sob a sua jurisdição e apela que Portugal apoie, firmemente, uma moratória internacional ao início da atividade mineira até que os efeitos da extração sejam profundamente estudados e se garanta que isso não trará consequências negativas para a biodiversidade.
O princípio da precaução deve ser aplicado, abandonando a ideia de que o crescimento azul, dito sustentável, se alcança por via da exploração de recursos oceânicos, especialmente em ambientes vulneráveis e fortemente desconhecidos. A mineração em mar profundo não é, de todo, compatível com a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável nem com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 14.
Notas para os editores:
(1) A mineração é uma atividade que envolve a exploração e extração de recursos minerais do fundo do mar, em profundidades abissais, para fins comerciais. Embora ainda não seja ainda praticada de forma comercial, o seu desenvolvimento tem sido alicerçado na falsa narrativa de que necessitamos impreterivelmente destes minérios para suportar a transição energética. Por ser uma atividade que opera a grandes profundidades, os impactos negativos e a sua extensão são pouco compreendidos, sabendo-se, no entanto, que os métodos altamente abrasivos a que recorre destroem o leito marinho, afetando habitats e espécies delicados, e libertam produtos nefastos para a saúde dos ecossistemas. Acresce o facto de os seus efeitos não serem apenas locais, podendo ter efeitos colaterais muito amplos – geralmente transfronteiriços -, a várias centenas de km de distância com alta conetividade, inclusivamente sobre atividades económicas humanas, como a pesca.
(2) Ao abrigo da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM), a AIFM é a organização através da qual os Estados partes da Convenção gerem e controlam as atividades de prospeção e exploração dos recursos minerais nos fundos marinhos além da jurisdição dos Estados costeiros – o mar internacional ou, como enunciado na CNUDM, a Área. No entanto, a CNUDM obriga também a uma proteção eficaz do ambiente marinho dos efeitos nocivos que possam advir de tais atividades, o que parece ser um contrassenso, uma vez que a mineração em mar profundo dificilmente pode coexistir com a proteção do ambiente. Desde 1982 que a AIFM tem trabalhado no desenvolvimento das potenciais regras que irão regulamentar a exploração dos fundos marinhos. Estabelecido pela CNUDM,a AIFM tem sido pressionada no sentido de terminar e adotar os regulamentos das atividades num prazo de 2 anos, ao fim do qual os pedidos de exploração dos fundos marinhos emitidos pelos Estados são automaticamente aprovados. No entanto, isto é, de acordo com a melhor ciência disponível, tempo notoriamente insuficiente para regulamentar uma atividade tão incerta e potencialmente prejudicial. De momento, está em pauta na próxima Assembleia da AIFM, que ocorrerá ainda este ano na Jamaica, o debate sobre a possibilidade de estabelecer uma política geral que estabeleça as bases para uma moratória ou pausa na mineração em mar profundo. Esta medida pretende conter a corrida desenfreada pela exploração dos fundos marinhos e proporcionar uma abordagem mais cautelosa e sustentável para a sua gestão.
(3) Com a crescente pressão por fontes alternativas aos combustíveis fósseis, a transição para energias limpas, como a solar e a eólica, tornou-se uma prioridade global. Para a construção de centrais solares fotovoltaicas e parques eólicos, são necessários minerais específicos, como cobalto, níquel, e terras raras, utilizados no fabrico de baterias, turbinas e outros componentes tecnológicos. Estes minerais são, no entanto, encontrados em quantidades significativas no fundo do mar, fazendo com que a mineração tenha vindo a tornar-se uma solução atraente para suprir esta procura crescente. Como resultado, esta pode escalar para proporções indesejáveis, tornando urgente agir com precaução, tanto em águas nacionais quanto internacionais. Vários países têm aprovado legislação para proteger o oceano contra este tipo de exploração, enquanto outros, como a Noruega, num passo totalmente desajustado com as negociações internacionais, avançam com a autorização de prospeção de minerais em águas profundas, no Ártico.
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