Início » Projeto da Mina da Lagoa Salgada é um perigo para os recursos hídricos da região
Terminou no passado dia 30 de abril, o processo de consulta pública do Estudo de Impacte Ambiental (EIA) da Mina da Lagoa Salgada, projeto que visa a exploração subterrânea de minerais metálicos de cobre (Cu), chumbo (Pb), zinco (Zn) e metais associados, onde se incluem o ouro (Au) e prata (Ag), nos concelhos de Grândola e Alcácer do Sal. A área abrangida é de 1.649 hectares e inclui infraestruturas para produção de energia fotovoltaica, corredor para linha elétrica e conduta de água para abastecimento da unidade. Este é um projeto com tempo de vida útil expectável de apenas 11 anos, com impactos ambientais, sociais gravosos, e que, incompreensivelmente, obteve o estatuto de Potencial Interesse Nacional (PIN), em 29 de abril de 2022. Esta posição crítica relativamente ao projeto em consulta pública é assumida pela associação ZERO, subscrita em conjunto com as organizações Associação de Agricultores de Grândola, FAPAS, GEOTA, Proteger Grândola e SPEA.
Trata-se de mais um exemplo de como a atribuição de estatuto PIN pode ser usada de forma discricionária para contornar restrições legais e facilitar a aprovação de um projeto privado, cuja utilidade pública é, no mínimo, muito discutível. Este EIA levanta sérias dúvidas, sobretudo quanto aos impactes nos recursos hídricos, ao incompreensível fracio
namento do projeto e à eficácia da compensação florestal.
Por outro lado, a presença de habitats de interesse comunitário, como o habitat prioritário charcos temporários mediterrânicos (habitat 3170*), é referida, mas não é analisada em profundidade. Sabe-se que na carta militar existe a identificação de várias lagoas temporárias nessa área, pelo que fica a dúvida sobre se o não aprofundamento desta situação é ou não deliberado.
Quanto aos recursos hídricos, destacam-se três preocupações principais.
Em primeiro lugar, o projeto indica que o consumo de água para fins industriais terá origem exclusivamente na água subterrânea, sem recurso a fontes externas. Esta circulará num circuito fechado, sendo compensadas eventuais perdas através do encaminhamento de água tratada, num volume médio estimado de 864 m³ por dia. No entanto, a informação apresentada não é suficientemente clara para dissipar dúvidas sobre o volume anual total de água necessário para o funcionamento da mina, sendo frequentemente utilizados dados relativos apenas a volumes médios extraídos. Ora, não existe qualquer plano alternativo (Plano B) para assegurar o abastecimento em caso de escassez extrema, como durante períodos de seca, o que poderá comprometer a própria operação da mina e criar impactes graves. Acresce que a Mina da Lagoa Salgada está inserida na Região Hidrográfica do Sado e Mira (RH6) que, sendo uma reserva estratégica essencial ao abastecimento público, enfrenta já situações críticas relacionadas com a escassez de água e a sobre-exploração dos recursos hídricos subterrâneos.
Em segundo lugar, preocupa a presença de áreas com rochas potencialmente geradoras de escorrências ácidas, o que representa um risco adicional de contaminação dos recursos hídricos, tanto na fase de exploração, como após o encerramento, devido a possíveis falhas ou anomalias nos depósitos de rejeitados previstos para uma área de cerca de 64 hectares.
Por fim, e em terceiro lugar, o promotor prevê a utilização de cianeto de sódio no processamento do ouro, justificando que as outras alternativas no mercado inviabilizam o projeto do ponto de vista técnico e económico. Contudo, trata-se de uma substância altamente tóxica, com riscos amplamente reconhecidos. Existindo alternativas tecnológicas no mercado, é inaceitável optar por uma abordagem com um potencial de impacte ambiental tão elevado, sobretudo sem garantias sólidas de segurança e de prevenção de acidentes.
No que à floresta diz respeito, este projetojunta-se a muitos outros que, de forma gradual, têm contribuído para a redução da área ocupada por sobreiros em Portugal. O promotor propõe compensar os 32,54 hectares afetados com a plantação de 73 hectares na Herdade da Nogueirinha, além da beneficiação de mais 10 hectares, num compromisso de gestão por 20 anos, afirmando que o povoamento se manterá por cerca de 200 anos. Apesar de este projeto de compensação poder ter méritos e benefícios para a espécie, trata-se de uma medida de longo prazo, que só produzirá efeitos dentro de várias décadas — muito para além da vida útil prevista da mina, estimada em apenas 11 anos. Existem, por isso, sérias dúvidas quanto à eficácia desta compensação, ao que acresce não existirem garantias de sobrevivência das novas plantações num contexto de alterações climáticas, tornando os cálculos de sequestro de carbono a 200 anos um exercício de especulação.
Por fim, este é um projeto que embora mencione o projeto da Linha Elétrica e o projeto da conduta adutora de água, verifica-se que, incompreensivelmente, ambos não serão alvo de avaliação no âmbito desta consulta pública, utilizando um artificio de fracionamento que não faz qualquer sentido em contexto de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA).
Para as organizações subscritoras, num cenário de combate às alterações climáticas que já estão a afetar milhões de pessoas em todo o mundo, inclusive na Europa, somos de parecer que estedesígnio europeu de reduzir a independência face a outros mercados não pode justificar uma extração de recursos minerais a qualquer custo, sem que sejam devidamente acautelados os impactes sociais, económicos e ambientais, e que esta lógica de simplificação e agilização de processos administrativos e da desvalorização dos processos de AIA só pode produzir efeitos contraproducentes em matéria de transição energética.
Cookie | Duração | Descrição |
---|---|---|
cookielawinfo-checkbox-analytics | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Analytics". |
cookielawinfo-checkbox-functional | 11 months | The cookie is set by GDPR cookie consent to record the user consent for the cookies in the category "Functional". |
cookielawinfo-checkbox-necessary | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookies is used to store the user consent for the cookies in the category "Necessary". |
cookielawinfo-checkbox-others | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Other. |
cookielawinfo-checkbox-performance | 11 months | This cookie is set by GDPR Cookie Consent plugin. The cookie is used to store the user consent for the cookies in the category "Performance". |
viewed_cookie_policy | 11 months | The cookie is set by the GDPR Cookie Consent plugin and is used to store whether or not user has consented to the use of cookies. It does not store any personal data. |