Início » Proposta de Definição de Âmbito (PDA) – Complexo Solar Fotovoltaico do Sado
A ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável, com base na consulta dos documentos disponibilizados no portal Participa, vem por este meio apresentar o seu parecer relativo ao PDA do Estudo de Impacte Ambiental (EIA) do Proposta de Definição de Âmbito (PDA) – Complexo Solar Fotovoltaico do Sado.
O Projeto da Central Fotovoltaica do Sado surge como mais um empreendimento fotovoltaico com o objetivo de aumentar a capacidade energética do país a partir de fontes renováveis (adicionando 600 MW de potência instalada), para promover a transição energética necessária e impulsionar o país para atingir as metas traçadas no Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC). Esta expansão das energias renováveis, particularmente das centrais solares fotovoltaicas, apesar de uma resposta necessária às exigências energéticas sustentáveis, suscita dúvidas sobre a eficácia da metodologia atual de AIA que é aplicada de forma casuística e sem uma visão holística, uma vez que estes projetos necessitam de uma articulação com várias infraestruturas, como a Rede Elétrica de Serviço Público, linhas de muito alta tensão (LMAT) e subestações elétricas.
Neste caso, o projeto em estudo é de um centro electoprodutor solar, que abrange uma área muito significativa de cerca de 1272 hectares (ha) localizada no concelho de Alcácer do Sal, distrito de Setúbal e que será submetido a AIA em fase de Projeto de Execução, com a linha de muito alta tensão (LMAT) em estudo prévio.
De notar que a ligação à RESP prevê-se realizar num futuro Posto de Corte de Alcácer do Sal 400kV que ainda não foi aprovado, estando previsto no PDIRT 2025-2034 (Plano de Desenvolvimento e Investimento da Rede Nacional de Transporte de Eletricidade para o período 2025-2034) – plano que se encontra em fase de análise da consulta pública e que aguarda aprovação em Conselho de Ministro.
Tendo em conta o que foi mencionado e os documentos disponibilizados na plataforma participa.pt, iremos tecer alguns comentários relativos à PDA do Complexo Solar Fotovoltaico do Sado quanto às dimensões que consideramos mais pertinentes:
Citando o relatório ambiental da Avaliação Ambiental Estratégica do PDIRT-E 2024: “a Rede Natura 2000 é uma rede ecológica para o espaço comunitário da União Europeia resultante da aplicação da Diretiva 79/409/CEE do Conselho, de 2 de abril de 1979 (Diretiva Aves) – revogada pela Diretiva 2009/147/CE, de 30 de novembro – e da Diretiva 92/43/CEE (Diretiva Habitats) que tem como finalidade assegurar a conservação a longo prazo das espécies e dos habitats mais ameaçados da Europa, contribuindo para parar a perda de biodiversidade. Constitui o principal instrumento para a conservação da natureza na União Europeia.”
A área da Central/Limite da Vedação sobrepõe-se na totalidade com a Zona Especial de Conservação (ZEC) Comporta/Galé (PTCON0034), como se pode verificar pela seguinte figura 3.2 da PDA.
A ZERO relembra que Portugal, no contexto do regulamento europeu para o Restauro da Natureza, tem a obrigação de restaurar o estado de conservação de 30% do seu território e que tem, tal como estudado pelo Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG), uma área artificializada e uma área fora de zonas de potencial conflito (áreas sensíveis, REN, RAN, etc) mais que suficientes para permitir que explorações energéticas, solar e eólica, atinjam os objetivos de neutralidade carbónica para 2045.
À luz das diretivas e regulamentos europeus e à luz do senso comum, não faz qualquer sentido as autoridades ambientais portuguesas permitirem a artificialização para centrais solares de espaços classificados, como é o caso aqui em estudo.
A instalação da central solar está prevista para uma área atualmente ocupada por plantações de eucalipto, o que, à primeira vista, pode sugerir uma fraca aptidão ecológica ou uma paisagem artificializada. No entanto, em vez de agravar esse nível de artificialização com uma infraestrutura industrial de larga escala, o caminho deveria ser o da renaturalização progressiva destes territórios, promovendo a recuperação ecológica e a biodiversidade.
É essencial sublinhar que a presença de eucalipto não elimina o valor ecológico do território, já que muitas vezes subsistem comunidades naturais no sub-bosque ou em áreas adjacentes, funcionando como refúgio para espécies nativas e habitats protegidos.
A região em causa insere-se numa área de elevada riqueza ecológica, com cerca de 40 habitats protegidos e 14 espécies endémicas de Portugal identificadas na envolvente. Entre os habitats com potencial ocorrência na área de implementação da central destacam-se os 2190 (Dunas costeiras com Juniperus spp.), 2250* (Dunas litorais com Juniperus spp.), 2260 (Dunas com vegetação herbácea), e 2270* (Dunas com florestas de Pinus pinea ou Pinus pinaster). O habitat 2260, em particular, merece especial atenção, pois pode ocorrer também no sub-bosque de plantações de eucalipto e inclui Thymus capitellatus, uma espécie endémica portuguesa. Este habitat encontra-se atualmente em regressão e o seu estado de conservação é considerado inadequado na região biogeográfica da Bacia do Mediterrâneo.
Assim, a instalação de uma infraestrutura desta dimensão numa área ecologicamente sensível comprometeria irremediavelmente habitats e espécies protegidas, contribuindo para o agravamento do estado de conservação de ecossistemas já fragilizados. A transição energética não pode ocorrer à custa do património natural, especialmente quando existem alternativas menos impactantes em áreas efetivamente artificializadas.
A aprovação deste projeto representa mais um passo na progressiva artificialização da Zona Especial de Conservação (ZEC), que já conta com cerca de 4.000 hectares ocupados por empreendimentos incompatíveis com os objetivos de conservação. Com esta nova central solar, a área artificializada poderá atingir os 18% da ZEC, quase um quinto da totalidade desta área classificada. Esta tendência compromete seriamente a integridade ecológica da ZEC e constitui um exemplo claro de impactes cumulativos, que não podem ser ignorados num processo de avaliação ambiental responsável.
Nesta PDA, o promotor demonstra, no sub-capítulo 5.1.4.17 Impactes cumulativos, pretender que se realize um estudo de impactes cumulativos restrito a projetos da mesma natureza que o projeto em análise (energética), como outras centrais solares, subestações ou linhas elétricas. No entanto, a ZERO defende que essa análise não se deveria restringir a uma só tipologia de artificialização, uma vez que todos os principais efeitos ecológicos negativos encontram-se refletidos neste projeto.
A instalação de painéis solares e a vedação contínua de uma área de 1.200 hectares terão um efeito de exclusão significativo sobre a fauna local, sendo que o efeito barreira, potenciado pela vastidão da área de implantação e localização do projeto em plena ZEC, irá restringir o movimento da fauna terrestre e agravar a fragmentação do habitat, afetando a coesão ecológica da paisagem. A gravidade dos impactes estende-se também à degradação do solo e da vegetação, essenciais ao suporte da biodiversidade local.
Para além da impermeabilização parcial do solo pelos painéis solares, a decapagem do solo não só diminui a capacidade de absorção de água daquela área, como representa um risco direto de mortalidade para pequenos vertebrados e compromete as funções ecológicas do ecossistema. Para além de que a movimentação intensiva de terras e maquinaria aumenta o risco de proliferação de espécies invasoras.
Importa sublinhar que este projeto não é um caso isolado, mas insere-se numa região já pressionada por outros empreendimentos, pelo que os seus efeitos não podem ser analisados de forma isolada, exigindo uma avaliação rigorosa dos impactes cumulativos e sinérgicos face aos compromissos assumidos para a conservação da ZEC, que têm sido recorrentemente postos em causa por falhas e negligências na análise de impactes ambientais e impactes cumulativos.
Face às questões acima levantadas, a ZERO considera que este projeto não necessita de realizar um EIA, uma vez que as informações disponíveis atualmente, nomeadamente a sua localização (em plena ZEC) e dimensão (>1000 ha), tornam o projeto de tal ordem incompatível com os objetivos de conservação e inaceitável do ponto de vista ambiental que deveria ser travado imediatamente, poupando à Agência Portuguesa do Ambiente o tempo e recursos para analisar um novo EIA. Deste modo, a ZERO emite parecer desfavorável em relação a este projeto.
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