Início » ZERO e Oikos apelam a compromissos reais para a proteção do oceano
De 9 a 13 de junho, realiza-se em Nice a 3.ª Conferência dos Oceanos das Nações Unidas (UNOC3), num momento crítico face às crises ambientais globais. A ZERO e a Oikos estarão presentes (ao lado de outras organizações não-governamentais), assim como representantes do governo, setor privado, comunidade científica, comunidades costeiras e povos indígenas, apelando a compromissos concretos e sustentáveis para proteger o oceano.
Sob o mote “Acelerar a ação e mobilizar todos os intervenientes para conservar e utilizar o oceano de forma sustentável”, a conferência combina sessões plenárias de alto nível com iniciativas da sociedade civil, alinhando-se com o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 14 – “Proteger a Vida Marinha”. Trata-se de uma nova oportunidade para reforçar a governação global do oceano, exigindo respostas efetivas, responsáveis e sustentáveis à altura dos desafios atuais.
Importa realçar que, à semelhança das edições anteriores, dada a natureza da conferência, ela tende a focar-se na construção de consensos em torno de possibilidades e caminhos desejáveis mas, infelizmente, não vinculativos.
A UNOC3 irá culminar com a adoção do “Plano de Ação de Nice para o Oceano” (“Nice Ocean Action Plan”), reunindo compromissos voluntários(1) com metas claras, e com a “Declaração de Nice para a Ação no Oceano” (“Nice Ocean Action Declaration”), um documento político não vinculativo, adotado por consenso, que refletirá a posição dos Estados-Membros sobre temas como biodiversidade, poluição, financiamento e governança, dando seguimento à conferência de Lisboa (2022).
O rascunho desta Declaração (zero draft)(2), divulgado em 2024, já foi alvo de contributos(3) da sociedade civil, que apelaram a mais ambição e inclusão, defendendo temas como os direitos humanos na ação climática, a proibição da pesca de arrasto em áreas protegidas e o princípio da precaução na mineração em mar profundo.
Além dos resultados formais, a UNOC3 deverá servir como palco diplomático para impulsionar posições-chave em acordos internacionais e lançar iniciativas com potencial transformador.
Espera-se um apelo político forte à ratificação deste tratado, prevendo-se que França assuma um papel impulsionador, enquanto país anfitrião e tendo concluído a sua ratificação(4) em fevereiro deste ano. Portugal foi um dos signatários mais recentes entre os 29 países que já o ratificaram, sendo necessárias 60 ratificações para a sua entrada em vigor. Durante décadas, o alto mar permaneceu como o lado oculto do oceano, sem regras claras. Este vasto território – que representa mais de 70% do oceano – deve ser reconhecido como bem comum da humanidade, gerido com justiça e base científica. O tratado vem colmatar uma lacuna existente na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar(5), permitindo avanços como a criação de Áreas Marinhas Protegidas nas zonas mais remotas. O oceano não conhece fronteiras, e os impactos das atividades humanas não se confinam às zonas económicas exclusivas dos países. É urgente abandonar abordagens fragmentadas e assegurar coerência entre medidas de conservação em águas jurisdicionais e internacionais.
Em março de 2025, durante o evento SOS Ocean! Summit, no contexto da preparação da conferência em Nice, o Presidente Emmanuel Macron propôs a criação de uma plataforma exclusivamente dedicada à proteção do oceano, inspirada no IPCC(6) (para o clima) e no IPBES(7) (para a biodiversidade). Concebido como um mecanismo liderado por um painel científico, o IPOS pretende colocar o oceano no centro da agenda política global, funcionando como uma plataforma colaborativa das Nações Unidas que produz informação credível e integrada para apoiar os decisores políticos e acelerar a implementação dos compromissos de proteção. Este visa responder a dois desafios estruturais: a fragmentação dos regimes de governação oceânica e a necessidade de integrar múltiplos tipos de conhecimento – científico, tradicional e local. Assume-se uma urgência superior à que marcou o processo climático, que levou mais de 30 anos até conduzir ao Acordo de Paris.
As Contribuições Nacionalmente Determinadas(8), apresentadas por cada país no âmbito do Acordo de Paris, têm ignorado largamente o papel do oceano – tanto na mitigação, como na adaptação às alterações climáticas. Lançada pela Ocean Conservancy e pelo World Resources Institute (WRI), e apoiada pela França e Brasil, esta iniciativa convida os países a incluir ações ligadas ao oceano nos seus compromissos climáticos, visando aumentar a visibilidade política e financeira dessas ações nas negociações internacionais e mobilizar mais recursos para intervenções costeiras e marinhas. A iniciativa assume particular relevância no caminho para a COP30 (Conferência das Nações Unidas sobre o Clima), que terá lugar este ano no Brasil, e onde também estaremos presentes.
Em 2022, durante a UNOC2, foi lançada uma Call to Action(9) por uma coligação internacional composta por organizações de África, Pacífico, América Central e Europa, reivindicando maior reconhecimento e apoio às comunidades costeiras, pescadores de pequena escala e povos indígenas. Entre os principais pontos, destacam-se a defesa do acesso preferencial a zonas costeiras para comunidades locais e pesca artesanal; a promoção da cogestão dos recursos com participação efetiva dessas comunidades nas decisões; o fortalecimento da representatividade das mulheres na cadeia de valor da pesca artesanal; e a proteção dos modos de vida tradicionais face ao avanço desregulado da economia azul industrial. Na sequência desta iniciativa, espera-se que a UNOC3 retome estas reivindicações, integrando-as oficialmente nos documentos políticos finais da conferência, conferindo-lhes maior visibilidade e peso político. É necessário corrigir o desequilíbrio de poder que mantém afastados da tomada de decisões sobre o oceano os pescadores tradicionais e de pequena escala, eles que são o maior grupo de utilizadores do oceano.
A par das oportunidades referidas, aguarda-se com expectativa que países com forte presença diplomática sigam o exemplo de França e Portugal, que têm adotado uma postura firme nas questões do oceano, assumindo compromissos relevantes e reforçando a visibilidade da proteção marinha no cenário internacional.
A conferência inicia-se oficialmente a 9 de junho existindo, no entanto, eventos especiais complementares nos dias anteriores, centrados nas questões mais ligadas à economia azul e à ciência para o oceano. Neste último, prevê-se que a Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, anuncie o Pacto Europeu para o Oceano(10), uma iniciativa que pretende estabelecer um roteiro de políticas europeias para reforçar a proteção e a gestão sustentável do oceano. Embora não integre o programa oficial, o pacto deverá ser debatido em eventos paralelos, permitindo reações e aprofundamento por parte das organizações.
A UNOC3 perceciona-se uma oportunidade simbólica e diplomática relevante para reforçar o lugar do oceano na agenda internacional. No entanto, o caráter voluntário dos compromissos, a ausência de metas claras e de mecanismos de responsabilização formal podem ser fatores limitantes para o impacto real das decisões tomadas. O formato “aberto”, sem metas nem estruturas de acompanhamento claras, incorre no risco de que muitas promessas fiquem por concretizar.
É fundamental que a conferência vá além de declarações retóricas e gere o impulso necessário para converter intenções em ações concretas e mensuráveis. Para tal, será necessário um esforço coletivo por parte dos Estados e demais atores, para que os compromissos voluntários assumidos tenham efeitos tangíveis na recuperação e conservação dos ecossistemas marinhos, evitando a repetição de bloqueios e impasses observados em processos anteriores.
Apesar das limitações, a ZERO e a Oikos mantêm uma visão construtiva: a UNOC3 deve ser um espaço de diálogo, pressão política e sinergias entre governos, comunidades, ciência e sociedade civil. Esperamos que marque um ponto de viragem com compromissos políticos e financeiros concretos. Com soluções já identificadas, é tempo de ouvir, ser ouvido e avançar com ações reais com impacto na saúde do oceano, para que este deixe de ser encarado como uma breve “nota de rodapé”.
Para além do seu papel como observadora e representante da sociedade civil, a ZERO dinamizará duas sessões paralelas integradas no programa oficial da UNOC3, promovendo a reflexão e partilha de boas práticas em áreas prioritárias da política oceânica.
A par destas atividades, a ZERO participará ainda na Marcha Azul(15), uma mobilização promovida por uma coligação de organizações liderada pela Seas At Risk, da qual é membro. A marcha terá lugar no dia 7 de junho, entre as 17h00 e as 19h00, com percurso entre a Plage Lenval e a Plage du Centenaire, onde se espera reunir mais de 2000 participantes. Esta ação visa lançar um apelo à necessidade de uma proteção efetiva do oceano, dirigido a decisores políticos e à comunicação social. Pretende ainda proporcionar um momento de convergência entre diferentes vozes e movimentos, através de uma mobilização ampla e inclusiva, envolvendo ONG, comunidades locais e costeiras, pescadores de pequena escala, representantes de povos indígenas e cidadãos preocupados com o futuro do oceano.
Os participantes estarão munidos de trajes alusivos ao oceano, pinturas faciais e cartazes com mensagens, dando visibilidade à urgência de compromissos políticos que assegurem uma mudança estrutural na forma como o oceano é gerido. Entre as principais reivindicações estarão a adoção do Princípio da Proteção — que inverte a lógica atual, colocando o ónus da prova sobre os setores com impacto no meio marinho —, o fim de atividades industriais nocivas em Áreas Marinhas Protegidas e a criação de uma moratória juridicamente vinculativa sobre a mineração em mar profundo, em águas nacionais e internacionais.
A Oikos, com apoio da Fundação Oceano Azul, terá uma presença ativa, dando voz às comunidades do Sul Global e participando em reuniões com coligações e doadores, ligadas aos seus projetos em São Tomé e Príncipe e Honduras. Aproveitará também o evento para estabelecer novas parcerias e soluções para as suas ações no terreno.
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