Início » ZERO defende fim das isenções fiscais no combustível aéreo para evitar distorções e emissões crescentes
Estudo da Federação Europeia de Transportes e Ambiente apresenta argumentos legais para aplicação de IVA.
Na maioria dos Estados-Membros da União Europeia (UE), o sector do transporte aéreo é beneficiado através de isenções fiscais em sede de Imposto Especial sobre o Consumo (IVA) sobre o combustível consumido em voos realizados dentro ou com origem na UE, o que não acontece com os combustíveis usados no transporte ferroviário e rodoviário.
Em Portugal, para além da isenção de IVA, o querosene utilizado na aviação beneficia ainda de isenção fiscal em sede do Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (ISP).Esta situação representa uma perda fiscal para o orçamento do país e funciona, na prática, como um subsídio ao sector, contribuindo para o crescimento do tráfego aéreo e das emissões associadas.
A Federação Europeia dos Transportes e Ambiente (T&E), da qual a ZERO faz parte, divulgou um estudo que traz soluções para os governos acabarem com estas isenções que são motivo de preocupação por toda a Europa.
Diretiva europeia sobre a tributação da energia permite a possibilidade dos Estados-Membros cobrarem IVA sobre o combustível aéreo
Em Portugal, os combustíveis da aviação estão isentos do pagamento de IVA e ISP, com a exceção da aviação de recreio privada (no caso do ISP).
A Diretiva europeia sobre a tributação da energia dá a possibilidade aos Estados-Membros de cobrar uma taxa de IVA sobre os combustíveis da aviação nos voos domésticos sem qualquer limitação, bem como nos voos entre países dentro do espaço económico europeu, na condição de estarem abrangidos por acordos bilaterais.
Se existir um acordo bilateral para tributar o combustível nos voos entre dois Estados-Membros da UE, tal medida pode também afetar os operadores de aeronaves registados num país terceiro dentro do espaço económico europeu. Neste caso, é possível que as companhias aéreas possam ser abrangidas por acordos bilaterais de serviço aéreo que proíbem ambos os Estados de tributar o combustível. Tal situação pode potencialmente criar distorções de mercado num sector altamente competitivo.
Numa análise legal realizada pela consultora CE Delft para a T&E [1], é possível concluir que os Estados-Membros da UE podem tributar o combustível aéreo nos voos entre eles, mesmo quando as companhias aéreas são provenientes de países terceiros (extra-UE) e estejam abrangidas por uma mútua isenção de tributação sobre o combustível quando operam nesse trajeto.
O argumento utilizado pelas companhias aéreas estrangeiras que operam dentro do espaço da UE – e que representam um pequeno número de voos face ao total – de que o combustível aéreo não pode ser tributado consegue ser ultrapassado através da introdução de um limite mínimo abaixo do qual o fuel utilizado não seria taxado.
Apesar das tentativas da indústria da aviação para se esconder atrás das provisões da Convenção de Chicago de 1944, este acordo não é o verdadeiro problema que está a impedir a tributação do combustível na UE, mas sim os antigos acordos bilaterais de serviço aéreo que os governos europeus assinaram há anos e que incluem isenções fiscais para o combustível usado pelas companhias provenientes de países fora do espaço aéreo da UE.
Os países da UE devem definir um limiar mínimo de tributação sobre o querosene aplicável a todas as companhias aéreas, e devem desenvolver esforços para remover todas as isenções fiscais. Até ao momento quase 30 acordos bilaterais foram renegociados com sucesso.
Apesar da aviação representar apenas cerca de 5% das emissões globais de gases com efeito de estufa, estas emissões duplicaram desde 1990 [2]. Um imposto sobre o querosene incentivaria as companhias aéreas e os fabricantes de aeronaves a reduzir o impacto ambiental do setor, internalizando os custos ambientais e aliviando o peso de outros impostos para os cidadãos e na melhoria dos serviços públicos.
Os Estados-Membros têm liberdade para obrigar as companhias aéreas a tributar impostos sobre o querosene utilizado em voos domésticos desde 2003, mas até agora apenas a Holanda atuou nesta matéria.
Tráfego aéreo e emissões associadas estão a crescer em Portugal, impulsionados pela melhoria da economia e pelo turismo. Impostos devem refletir os custos ambientais deste sector.
Todos os aeroportos nacionais geridos pela ANA – Aeroportos de Portugal têm evidenciado uma tendência de aumento de tráfego, quer do número de movimentos quer de passageiros transportados nos últimos anos, com especial destaque para o Aeroporto de Lisboa, sendo este o principal argumento para o alargamento do atual aeroporto e construção do novo Aeroporto do Montijo.
Este aumento de tráfego está sobretudo relacionado com a recuperação económica, mas também com a atratividade do sector do turismo centrada nas principais cidades de Lisboa e Porto, onde o investimento das companhias áreas de baixo custo (low cost) tem sido mais significativo.
Para a ZERO, é inaceitável que o Estado Português continue a manter as isenções fiscais para os combustíveis da aviação, as quais não só representam uma perda fiscal como não permitem internalizar os custos ambientais, ao mesmo tempo que beneficia um dos modos de transporte mais intensivos em emissões de carbono, penalizando os consumidores sobretudo os que não utilizam este modo de transporte.
No momento em que a UE e os seus Estados-Membros, nomeadamente Portugal, estão a definir um caminho para descarbonizar a sua economia, e o sector dos transportes em particular até 2050, esta isenção é inadmissível.
Notas para os editores
[1] Análise legal sobre a imposição de impostos sobre o combustível da aviação na Europa (realizado pela consultora CE Delft para a T&E):
[2] Lee, D. et al., 2009. Transport impacts on atmosphere and climate: Aviation. Atmospheric Environment. https://core.ac.uk/download/pdf/30987495.pdf
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